Ex-agentes da extinta Superintendência de Campanhas de Saúde Pública - Sucam podem estar morrendo por intoxicação do Diclorodifeniltricloroetano - DDT usado contra a malária na década de 70. Dos 540 funcionários do órgão à época, 240 já morreram. A denúncia e o levantamento foram feitos pela Associação DDT e Luta Pela Vida no Estado do Acre.
De acordo com o presidente da associação, Aldo Moura, que também é ex-empregado da Sucam, que luta há 14 anos para que os trabalhadores sejam reconhecidos e as famílias indenizadas pelo Estado, o grande problema é que a intoxicação não é reconhecida pelo poder público. “Por isso, os ex-agentes estão morrendo sem assistência especial do Estado”.
Apenas em 2014, a associação contabilizou 11 mortes de ex-agentes. No início de janeiro de 2015, dois homens já morreram. Atualmente, a associação luta para que esses trabalhadores que prestaram serviço ao Estado possam contar com uma unidade de saúde específica para amenizar as dores que sentem. A evolução dos sintomas é semelhante para todos: começa com a perda do tato, coceira, formigamento na língua. Alguns desenvolvem câncer, todos têm os movimentos paralisados e não conseguem andar ou movimentar-se. Aos poucos, órgãos como o coração, rins e fígado vão apresentando deficiência.
De acordo com o diretor de Saúde e Segurança do Trabalhador do Sinait, Francisco Luís Lima, é lamentável que isso tenha acontecido. “Os problemas com inseticidas são similares aos do uso de agrotóxicos pelos aplicadores que adoecem pela exposição ao produto que também causa intoxicação”.
Segundo Luís Lima, a falta de treinamento adequado e a não utilização de equipamentos de proteção individual provocam o adoecimento do trabalhador e futuras sequelas em função do contato com o produto. “Os ex-agentes provavelmente não tiveram treinamento de como manipular os inseticidas, além do uso obrigatório do equipamento de proteção individual. Estes fatores ocasionam lesões, como a que eles estão sofrendo”.
Histórico
O DDT começou a ser usado no Brasil logo após o fim da Segunda Guerra Mundial. Naquela época, homens, sobretudo da região amazônica, conhecidos por 'guardas mata-mosquitos' ou apenas 'soldados da malária', foram recrutados para combater uma verdadeira guerra contra o mosquito vetor da malária e outras endemias. Sem conhecimento e acreditando que o veneno era inofensivo ao ser humano, os agentes se embrenhavam na mata e tinham contato direto com o produto, usando apenas um chapéu de alumínio e uma farda.
Antes de ser Sucam, o órgão era denominado Campanha de Erradicação da Malária (CEM), quando a maioria dos trabalhadores entraram para desenvolver o trabalho de agentes de endemias. Hoje, os funcionários da extinta Sucam que não estão aposentados são vinculados ao Ministério da Saúde. Porém, Aldo denuncia que o órgão nem mesmo os reconhece. Além disso, se diz abandonado pelo Estado. Atualmente, eles lutam por uma indenização de R$ 100 mil e buscam, do governo do Acre, uma unidade que dê preferência à exames e atendimento desses ex-servidores.
Ministério da Saúde diz que intoxicação não é comprovada
Em nota ao G1, o Ministério da Saúde alega que não há nenhum exame que comprove que as doenças desenvolvidas por esses homens sejam em decorrência do contato direto com o DDT e afirma que os servidores têm a assistência assegurada pelo Sistema Único de Saúde - SUS. Segundo o Ministério da Saúde, “a Justiça eximiu o poder público de realizar atendimento especial a esses servidores por não ter constatado a lesividade do DDT”.
A Secretaria Estadual de Saúde (Sesacre) reforçou o argumento do Ministério da Saúde e disse que, como a intoxicação pelo DDT não foi comprovada, não é possível oferecer um atendimento diferenciado aos ex-agentes.
Processo de ação civil pública do MPF/AC aguarda julgamento
O Ministério Público Federal no Acre – MPF/AC impetrou ação civil pública em 2009, onde pedia a indenização e o atendimento pelo poder público aos ex-agentes da Sucam. A Justiça julgou a ação improcedente alegando que não havia provas suficientes da intoxicação desses homens pelo DDT. Em 2013, o órgão recorreu da decisão alegando que " tanto a Funasa, na qualidade de sucessora da Sucam, quanto a União, em última análise, são as responsáveis pela exposição das vítimas ao DDT" e destaca que o poder público deve prestar assistência à população atingida pelo pesticida.
De acordo com o MPF/AC, a ação foi ajuizada após muitas tentativas de solução extrajudicial do caso, onde o poder público não reconhecia o direito dos agentes. Após a ação ainda foram tomadas algumas medidas.
Em um trecho do documento, o MPF ressalta ainda que "a documentação produzida, no entender do MPF, revela o descaso do Estado para com os funcionários e ex-funcionários da Sucam/Funasa [Fundação Nacional de Saúde] contaminados pelo DDT, cujas moléstias decorrentes de possíveis intoxicações demandam atenção especializada, por parte do poder público".
O MPF-AC aguarda decisão da justiça sobre a ação, que está parada no Tribunal Regional Federal, da 1º região, desde agosto 2013.
Com informações do G1 Acre.