O Fórum Nacional em Defesa da Lei nº 12.619/2012 – FNDL, do qual o Sinait faz parte, ingressou com representação na Corregedoria da Câmara dosa Deputados, motivado por uma acusação de pagamento de propina para que pessoas aplaudissem, durante uma sessão, na galeria do plenário, os deputados favoráveis ao Projeto de Lei 4.246/2012, que altera a Lei do Descanso dos Motoristas. Eles teriam sido pagos para se passarem por trabalhadores do setor de transportes. O documento foi protocolado nesta terça-feira, 6 de maio, com a presença do corregedor Átila Lins (PSD/AM) e do deputado Chico Alencar (PSOL/RJ).
A sessão ocorreu na noite da última quarta-feira, 30 de abril, véspera do feriado de 1º de maio. Durante a votação do PL, de autoria do deputado Jerônimo Goergen (PP/RS), várias pessoas aplaudiram os parlamentares que votavam pela aprovação da matéria. Logo depois, a reportagem do jornal “Correio Braziliense” flagrou um assessor do deputado Nelson Marquezelli (PTB-SP) pagando propina para os presentes na galeria. Segundo o jornal, seria para forjar o apoio da categoria dos motoristas ao Projeto.
Nas últimas semanas, o FNDL trabalhou na Câmara para que o PL 4.246/2012 não fosse votado porque desconfigura a Lei dos Motoristas e prejudica os trabalhadores. A Lei 12.619/2012 prevê regulamentação de jornada e pausas para repouso, entre outros direitos, mas causou polêmica na bancada patronal e ruralista que tenta a todo custo alterar ou mesmo revogar a Lei.
Átila Lins afirmou que a função da Corregedoria é repor a verdade dos fatos em relação ao comportamento do parlamentar. “Eu posso assegurar que nós vamos dar uma atenção especial ao caso, apurar com todo vigor e velocidade possível”. Ele informou que, de acordo com o Regimento da Câmara, a Corregedoria é obrigada a solicitar que o presidente da Casa, Henrique Eduardo Alves (PMDB-RN), tenha um juízo de admissibilidade sobre o assunto. “E ele já se posicionou na imprensa que vai encaminhar a admissibilidade para a Corregedoria apurar”.
Para Átila, o objetivo é garantir a transparência. “Se nós encontrarmos indícios fortes de que realmente houve a quebra do decoro, vocês podem ter certeza que nós enviaremos uma representação à Mesa Diretora para que possa, segundo o Regimento, encaminhar ao Conselho de Ética”, assegurou.
A representação foi entregue ao Corregedor pelo presidente da Confederação Nacional dos Trabalhadores em Transportes Terrestres – CNTTT,Omar José Gomes.
Prevenção
De acordo com o Fórum, a Lei 12.619/2012 já salvou 1.587 pessoas até o final de 2013, só nas rodovias federais. Mais de quatro mil trabalhadores morrem por ano e isso custa ao país, anualmente, R$ 16,6 bilhões de transferência indevida de custos em tratamento de feridos e sonegação de horas extras.
A Auditora-Fiscal do Trabalho Jacqueline Carrijo, que representa o Sinait no Fórum e coordena operações de fiscalização do setor de transporte em Goiás, confirmou a redução dos acidentes, inclusive fatais, após a sanção da Lei 12.619/2012, e que o setor registra altos índices de morte de trabalhadores. “Aquelas manifestações no plenário se passaram por legítimas, sendo que a representação legítima está aqui. Ficamos indignados e revoltados com isso”, ela acrescentou, se referindo aos integrantes do Fórum presentes.
Jacqueline disse que a Auditoria-Fiscal do Trabalho, o Ministério Público do Trabalho – MPT e os trabalhadores defendem a Lei por considerá-la um instrumento de segurança nacional. “Esperamos que essa situação – um verdadeiro prejuízo ao país – seja corrigida”, destacou.
Contaminação
O Procurador do Trabalho Paulo Douglas Almeida de Moraes salientou que o processo legislativo do Projeto ainda não foi concluído. Ainda tem a discussão no Senado e a Câmara também pode reexaminar a matéria. De acordo com ele, a votação foi contaminada e não refletiu o interesse público. “Como essa contaminação existiu, esperamos que ela seja retirada a ponto de resgatar um produto legislativo que coincida com o verdadeiro anseio da sociedade”.
Paulo disse que o Fórum agora vai se dirigir ao Senado para que a apreciação do Projeto esteja livre de qualquer contaminação de legitimidade. “Pode-se dizer que o que houve na Câmara foi uma falsidade, uma fraude, alguém se dizendo ser quem não é, no caso motoristas e trabalhadores, para induzir os representantes do povo em uma tomada de decisão”.
Paulo ressaltou que o Ministério Público do Trabalho – MPT também está fazendo exame de constitucionalidade do Projeto.
O Secretário-Executivo do Fórum, Hamilton Dias, informou que a CNTTT possui 330 sindicatos de trabalhadores credenciados e onze Federações. “As pessoas que aplaudiram os parlamentares não representam os oito milhões de trabalhadores do setor filiados às entidades”.
Hamilton contou que estava no plenário durante a votação e vários deputados, de vários partidos, disseram a ele que não receberam o texto do Projeto pelo menos 30 minutos antes da sessão. “Pelo menos os líderes deveriam ter recebido antes”, alertou.
Vergonha
De acordo com o deputado Chico Alencar (PSOL/RJ), a assessoria técnica e jurídica do PSOL está avaliando a possibilidade do partido ingressar com uma Ação Direta de Inconstitucionalidade – Adin em relação ao projeto que prevê jornada de doze horas aos trabalhadores.
Sobre o pagamento de “claque”, ele afirmou não ser a primeira vez que isso ocorre na Câmara e que o caso da votação sobre Lei dos Motoristas foi denunciada “graças ao jornalismo investigativo do jornal Correio Braziliense”, que flagrou o pagamento sendo feito por um assessor do deputado após a sessão, inclusive com vídeos. “Isso atenta contra a credibilidade do Parlamento como instrumento de democracia, é uma tragédia. É militância de aluguel, galeria mercenária. Alguém que defende uma causa que não é sua em troca de dinheiro”.
Chico Alencar completou que é plenamente a favor das galerias abertas no plenário, aceita até ser vaiado. “Nem sempre há concordância, claro que é melhor ser aplaudido. A reação do público no plenário faz parte do processo democrático e há flexibilidade regimental quanto a isso, dependendo da ocasião”.
Porém, ele acredita que tudo depende também do tipo de galeria que se montou. Ele pediu ao corregedor que investigue o caso porque isso depõe contra a Câmara. Sugeriu que, a partir da apuração do caso, sejam estabelecidas regras proibitivas desse tipo de procedimento. “O Poder Legislativo já sofre muito desgaste por ser o mais aberto de todos e isso é muito negativo. E ainda com desfaçatez, o pagamento foi feito aqui dentro, é vergonhoso e chocante”.
Segundo informações recebidas por Chico Alencar, parte do grupo que recebeu dinheiro para aplaudir os deputados favoráveis ao projeto são do serviço de limpeza da Casa. “Eles são os menos responsáveis por isso e quase sempre têm necessidades financeiras. A culpa é de quem organizou, quem ofereceu dinheiro para que as pessoas acompanhassem uma sessão”, alertou.
O deputado do PSOL pediu à corregedoria que investigue também como foram dados os comandos para vaias, aplausos e outras reações. Ele lembrou que havia faixas suspeitas e genéricas na galeria com os dizeres: “Obrigado deputados” ou “Vote sim”, que não pareciam ter sido confeccionadas por alguma entidade representativa dos trabalhadores. “Não acreditei que a categoria estivesse defendendo aquelas orientações, até porque os deputados que se pronunciaram favoráveis eram da bancada ruralista”, concluiu.