Neste 8 de março, Dia Internacional da Mulher o Sinait homenageia as Auditoras Fiscais do Trabalho que todos os dias contribuem para a construção de um país melhor.
Atualmente, dos 2.759 Auditores-Fiscais do Trabalho que estão na ativa, 1.034 são mulheres. A maioria delas está nos estados de São Paulo (170), Minas Gerais (125) e Rio de Janeiro (84). As Auditoras atuam em diversas áreas, prevenindo acidentes de trabalho, doenças ocupacionais e promovendo a saúde e segurança dos trabalhadores brasileiros.
Elas fiscalizam o registro em carteira, a jornada de trabalho, o pagamento de salários e o recolhimento de contribuições que incidem sobre a folha de pagamento dos salários, como é o caso do FGTS. Assim como os Auditores, também resgatam trabalhadores escravizados na área rural, na construção civil e nas fábricas de costura, em grandes capitais. Ainda promovem a inclusão de pessoas com deficiência e afastam menores da situação do trabalho irregular.
No campo ou na cidade sua atuação significa o resgate da cidadania para milhares de brasileiros. Elas fazem jus ao dinamismo que a profissão requer e independente de ocuparem ou não cargos de chefia, sua atuação é motivo de orgulho para toda a categoria em razão da competência, capacidade, desprendimento e amor ao trabalho que desenvolvem na defesa dos direitos dos trabalhadores, e no atendimento dos fundamentos do Estado Democrático de Direito, dispostos no artigo 1º da Constituição Brasileira: cidadania, dignidade da pessoa humana e valor social do trabalho.
Para retratar a atuação dessas guerreiras em campo, o Sinait entrevistou a Auditora-Fiscal do Trabalho Jacqueline Carrijo, de Goiás, que conta como é o dia a dia da profissão. Há 18 anos como Auditora-Fiscal, ela já trabalhou em diversas áreas da fiscalização trabalhista. Foi coordenadora Nacional do Grupo Especial de Fiscalização Móvel por aproximadamente quatro anos e do Grupo Móvel Rural da Superintendência Regional do Trabalho e Emprego de Goiás – SRTE/GO durante um ano e meio. Desde janeiro de 2010, é a coordenadora regional das Auditorias-Fiscais do Trabalho nos setores de Transporte de Cargas e Passageiros e de Saúde Pública e Privada. Entre as várias atuações no setor de transportes está o combate ao tráfico de pessoas para fins laborais e de crianças e sexuais.
Demonstrando ser apaixonada pelo que faz e comprometida com a sua missão de garantir o bem-estar dos trabalhadores e trabalhadoras, Jacqueline falou sobre as dificuldades na carreira de Auditora-Fiscal do Trabalho, suas experiências e as principais irregularidades trabalhistas que afetam as mulheres.
Leia a entrevista abaixo.
Sinait – Como é exercer uma profissão que a princípio, aos olhos dos leigos, requer um perfil masculino para atuar, devido às longas distâncias a percorrer nas fiscalizações feitas na área rural, ou até mesmo por, no geral, lidar com homens no comando das empresas fiscalizadas, independente de ser no campo ou na cidade?
Jacqueline Carrijo – Eu nunca me senti afrontada, desrespeitada na Auditoria-Fiscal por ser mulher. E na minha visão, isso tem muito a ver com as mulheres que abriram fronteiras na Fiscalização do Trabalho. Mulheres fortes, de expressão e que são as minhas referências como Valderez Monte. Ela, com iniciativa, atitude e liderança marcou com honra a atuação das mulheres na Fiscalização do Trabalho, com posições firmes e atuações corajosas na defesa da classe trabalhadora nas áreas mais inóspitas do País.
De fato é preciso ter disposição e resistência física para percorrer longas distâncias, suportar as trepidações, atoleiros nas estradas rurais, os obstáculos das pontes quebradas, árvores tombadas no meio da estrada. Enfim, é preciso ter condições físicas para aguentar o que vier pela frente: calor, frio, sol, chuva, falta de sono. E quando finalmente chegamos onde os trabalhadores estão, mesmo cansados, precisamos colher as provas e depoimentos, fotografar, filmar e resgatar. Por várias vezes, eu colhi depoimentos de trabalhadores no meio de plantações, nas queimadas, nas aplicações de agrotóxicos, no meio de carvoarias com fornos queimando sob o sol inclemente ou chuva. Muito sol, calor, chuva, poeira, fuligem. Já passei muitas noites sem dormir procurando e fiscalizando frentes de trabalho e alojamentos de trabalhadores no meio do mato e das cidades, nas rodovias flagrando jornada exaustiva de motoristas, enfrentando transporte ilegal de trabalhadores. Isso tudo faz parte do mundo do trabalho, faz parte de nós também.
Nas auditorias do trabalho eu me posiciono como agente de Estado, e nos considero agentes de mudança. Condenamos as más condições de trabalho, a superexploração do trabalho humano, e provocamos mudanças, deixando melhorias nas relações de trabalho que fazem a diferença na vida do trabalhador, da sua família e da sociedade. Nós participamos da vida do trabalhador na conquista efetiva de seus direitos, e também criamos oportunidades de trabalho e emprego dignos. Nós fazemos a diferença para o mundo do trabalho melhor.
Sinait – Onde é mais difícil atuar, no campo ou na cidade?
Jacqueline - A Auditoria-Fiscal do Trabalho tem poderes fortes para garantir e promover relações de trabalho justas, seguras, saudáveis. E na expressão de poderes, para fazer cumprir a Lei, há risco à integridade física das Auditoras-Fiscais em todos os ambientes, urbanos e rurais, e em todos os Estados da federação. Ser uma fiel cumpridora das normas de proteção do trabalhador é um desafio para todas nós, ainda mais que estamos trabalhando dentro de uma instituição tão mal aparelhada, desestruturada e sem as condições de trabalho necessárias como está o Ministério do Trabalho e Emprego - MTE. Nós extrapolamos na criatividade para levar a nossa força, conhecimento e o melhor de cada uma de nós para a classe trabalhadora.
Sinait – Tem algum caso de resgate de trabalhador que lhe comoveu mais que o outro?
Jacqueline – Não, todos os resgates de trabalhadores realizados pelas equipes que coordenei foram comoventes.
Sinait – Quais são as irregularidades trabalhistas mais freqüentes? Essas irregularidades são cometidas mais contra o trabalhador ou contra a trabalhadora, ou seja, quem é mais explorado o homem ou a mulher?
Jacqueline - Falta de condições mínimas de segurança no trabalho (EPI e EPC), falta de condições de higiene e segurança nos alojamentos, nas frentes de trabalho, falta de segurança alimentar, hídrica nos trabalhos insalubres, penosos executados sob calor intenso, assédio moral, assédio sexual, trabalho proibido para menores de 18 anos, falta de segurança no transporte de cargas e trabalhadores e descumprimento da IN-91.
Sinait - A senhora vivenciou alguma situação durante as fiscalizações que lhe deixou constrangida ou intimidada?
Jacqueline – Sim, e penso que não há um Auditor Fiscal do Trabalho nesse país que não tenha em algum momento no exercício de suas funções sofrido algum tipo de constrangimento ou se sentido ameaçado de alguma maneira. Os momentos das verificações físicas, de entrega dos autos de infração, interdições, embargos no geral são bastante tensos.
Sinait – O que precisa ser feito para melhorar a atuação da fiscalização no Brasil?
Jacqueline - Em primeiro lugar precisamos de garantia de proteção. Precisamos que o Estado garanta proteção dos Auditores-Fiscais do Trabalho para que possamos expressar todos os nossos poderes com isenção. O Auditor Fiscal do Trabalho com medo coloca em risco a segurança nacional, pois deixará de cumprir as suas missões institucionais. Nós somos agentes controladores do respeito de todos às legislações trabalhistas, nossos poderes existem para isso. Hoje estão cada vez mais freqüentes ameaças e agressões físicas aos Auditores-Fiscais. Então, é preciso repensar a nossa forma de atuar.
Necessitamos de concurso público com número de vagas suficientes para atender as necessidades da classe trabalhadora e a quantidade de empresas e empreendimentos em atividade no Brasil hoje. Precisamos de Auditores-Fiscais do Trabalho, agentes administrativos e motoristas. Precisamos de prédios seguros, confortáveis e com toda a infraestrutura de informática.
Outra necessidade importante é a estruturação da Escola Nacional da Inspeção do Trabalho- ENIT. O mundo do trabalho é complexo, dinâmico, repleto de especificidades e muito exigente. Precisamos aprimorar a nossa capacidade de resolução de problemas, buscando soluções efetivas de alcance coletivo.
Sinait – E para melhorar a vida dos trabalhadores e trabalhadoras?
Jacqueline – Na minha opinião, para melhorar a vida dos trabalhadores/as, é essencial que os governos invistam na educação, valorizem os professores, respeitem os brasileiros. Esse é o setor econômico mais importante do Brasil. Somente conseguiremos acabar com as desigualdades que fomentam o trabalho infantil, trabalho escravo no Brasil quando os governantes levarem a sério a educação, garantindo a todos o acesso à educação pública, gratuita e de qualidade.