Nas últimas semanas, no estado da Bahia, em especial na região oeste do estado, algumas iniciativas vêm sendo empreendidas com o objetivo de macular a fiscalização do trabalho e, por conseguinte, o direito do trabalho, aspecto essencial dos direitos humanos universais e valor fundamental da Constituição Federal do nosso país.
Os Auditores-Fiscais do Trabalho são as principais vítimas de eventuais condições inadequadas das instalações das sedes do Ministério do Trabalho e Emprego. Eles não têm governabilidade sobre orçamento e execução de recursos. É pauta contínua de luta do SINAIT, inclusive, a melhoria das condições de trabalho dos Auditores Fiscais. Como cidadãos preocupados, os empregadores poderiam aproveitar as reuniões que realizam para pressionar as instâncias responsáveis para melhorar tais situações alegadas, ao invés de justificar práticas ilegais por supostas inconformidades que prejudicam os próprios acusados. De todo modo, essas alegações não têm nenhuma relação com as obrigações dos empregadores de dar tratamento digno àqueles que produzem os seus lucros.
Ao contrário do que diz uma das reportagens, a remuneração dos Auditores-Fiscais não tem (nem nunca teve) relação com as autuações efetuadas. A remuneração é fixa, independente do número de autos de infração lavrados. Os autos de infração são lavrados em conformidade com o artigo 628 da CLT, que obriga a lavratura pela autoridade sempre que constatada infração à legislação. Trata-se, portanto, de uma obrigação legalmente imposta aos Auditores, e não de uma vontade individual da autoridade administrativa.
Além de uma obrigação legal, o auto de infração é um instrumento de orientação aos empregadores, pois nele constam detalhadamente as inadequações à lei que forem constatadas. Ao empregador é garantida ampla defesa, caso discorde, visto que o auto de infração inicia um processo administrativo com todas as garantias e formalidades legais. O auto de infração é também um instrumento de justiça e defesa da ordem econômica, pois combate a concorrência desleal entre empregadores, já que aquele que não cumpre as normas não pode tirar vantagem da ilegalidade, o que prejudicaria os bons empregadores. Portanto, os empregadores honestos têm todo interesse que a fiscalização do trabalho cumpra estritamente seu papel.
As alegações das dificuldades para cumprimento das normas de proteção ao trabalho feitas nos documentos citados, são totalmente falsas. Os procedimentos de registro de empregados e pagamento das obrigações legais são extremamente simples, em especial em um mundo que há anos é regido pela ampla informatização e acesso à rede de computadores. O descanso semanal remunerado é direito indisponível e garantia a todo e qualquer trabalhador e deve ser respeitado em qualquer situação, visto que se trata de meio de preservação da saúde do ser humano.
A norma regulamentadora 31 (NR-31) está em vigor desde 2005 e é produto de negociação tripartite com presença nacional dos empregadores. Destarte, os empregadores são co-responsáveis pela elaboração das normas. Os empregadores, inclusive, têm obrigação legal de ser capacitados ou contratar serviço próprio de segurança e saúde do trabalho justamente para fazer a aplicação de eventuais previsões de maior complexidade. De todo modo, o órgão local do Ministério do Trabalho é público e conta com serviço de orientação aos cidadãos. O empregador que tiver dúvidas e interesse efetivo em cumprir a legislação deve comparecer à Gerência do Trabalho mais próxima e pegar uma ficha para atendimento. Além de tudo isso, ao contrário do que consta nas reportagens, as obrigações contidas na NR-31 são quase todas de simples aplicação e caráter humanitário, como fornecimento de água limpa, local para refeição, sanitário, alojamento digno, bastando o mínimo de interesse para cumpri-las.
Justamente as normas mais elementares são as mais desrespeitadas pelos empregadores, como fornecimento de mesas, assentos e abrigo para realização das refeições, alojamento adequado, transporte de trabalhadores em veículos projetados para tal fim, realização de exames médicos, entre diversos itens básicos de tratamento digno entre seres humanos, conforme consta detalhadamente nos relatórios de fiscalização dos Auditores-Fiscais fartamente documentados. Ou seja, desinformação e dificuldade de aplicação em nada se relacionam com o descumprimento da lei pelos empregadores.
Os empresários em questão querem se apresentar como defensores dos trabalhadores e relacionar direito do trabalho com nível de emprego, quando na verdade não há qualquer vínculo entre normas de proteção ao trabalho e número de trabalhadores contratados. Empregador nenhum dá emprego, mas sim demanda mão de obra. Ou seja, ele contrata exatamente a quantidade de pessoas necessárias para a produção dos seus lucros, porque ele precisa.
Trata-se de uma lei elementar da economia: a determinação do número de empregados se define fora do mercado de trabalho, especificamente, pela demanda agregada. Assim, mesmo que o custo de contratação de trabalhadores fosse zero, não haveria qualquer crescimento da quantidade de empregados ocupados, porque tal só ocorre com ampliação de demanda. O que as normas de proteção ao trabalho que eles resistem a cumprir fazem, de fato, é garantir a vida e dar dignidade às pessoas.
Assim, é mais do que evidente que há outros interesses em questão na mobilização desses empresários rurais contra a fiscalização do trabalho. Cumprir a lei não custa muito, mas os empregadores parecem preferir iniciativas heterodoxas ao cumprimento da legislação como forma de evitar as autuações. É essencial ressaltar que o oeste da Bahia é foco histórico de trabalho análogo ao escravo.
Uma das reportagens noticia um encontro com presença de ministro de Estado, deputados, empresários e seus representantes diretos para discutir sobre a conduta da fiscalização, sendo imputadas falas aos diversos atores participantes.
O SINAIT vem prestar integral apoio ao trabalho realizado pela fiscalização do trabalho, em particular, à equipe em atividade na região oeste do estado da Bahia, e rechaçar qualquer hipotética tentativa de interferência, independentemente da origem, no devido cumprimento dos deveres legais dos Auditores-Fiscais, que é expressamente vedada pelas Convenções Internacionais ratificadas pela Brasil e pela legislação federal.
Esse tipo de mobilização empresarial contra o direito do trabalho, por meio de ataque aos agentes legitimamente incumbidos da sua efetivação, não foi a primeira, e talvez não seja a última. Contudo, o SINAIT sempre se posicionará em defesa da dignidade da pessoa humana, do direito do trabalho e, por conseguinte, das ações e prerrogativas da fiscalização do trabalho, mecanismo essencial para a realização dos referidos valores.
A Auditoria Fiscal do Trabalho é atividade prevista na Constituição Brasileira (art. 21, XXIV) e tem sua regras determinadas pela Convenção 81, da Organização Internacional do Trabalho (OIT), ratificada pelo governo brasileiro, e pelas normas da CLT.
Os fundamentos do Estado Democrático de Direito estão na prevalência dos direitos humanos, da cidadania, da dignidade da pessoa humana, da redução das desigualdades sociais e dos valores sociais do trabalho.
As diversas atribuições dos Auditores Fiscais do Trabalho se fazem presentes na luta diária pelo trabalho decente, no combate ao trabalho escravo, erradicação do trabalho infantil, o registro em carteira e combate à informalidade; pagamento de salários, cujo resultado reflete no recolhimento do FGTS, contribuição previdenciária, do Imposto de Renda, no Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT) e pagamento do Seguro Desemprego. E é desse modo que os Auditores Fiscais do Trabalho concorrem, efetivamente, para a validação dos princípios fundamentais do Estado Democrático de Direito, onde deve prevalecer a cidadania, a dignidade da pessoa humana e os valores sociais do trabalho.