Um diagnóstico inédito da Organização Internacional do Trabalho (OIT) revela que a maioria das crianças e adolescentes em situação de trabalho infantil no Brasil é formada por jovens negros que vivem fora das capitais e das regiões metropolitanas. Os dados reforçam a persistência das desigualdades sociais, raciais e territoriais e destacam a importância da atuação do Estado, especialmente da Auditoria-Fiscal do Trabalho, no combate a essa grave violação de direitos humanos.
O estudo “Dimensões do Trabalho Infantil no Brasil: desafios persistentes e caminhos para acelerar a erradicação”, elaborado pelo Escritório da OIT no Brasil com base em dados oficiais de 2023, aponta que 1,607 milhão de crianças e adolescentes de 5 a 17 anos estavam em situação de trabalho infantil naquele ano, o equivalente a 4,2% da população nessa faixa etária — o menor percentual da série histórica iniciada em 2016 pelo IBGE. Desse total, 586 mil exerciam atividades classificadas como perigosas, insalubres ou degradantes.
Segundo o levantamento, a maioria das crianças e adolescentes em situação de trabalho infantil é composta por meninos, negros, com idade entre 16 e 17 anos, residentes em áreas urbanas fora das capitais e regiões metropolitanas, com maior concentração nas regiões Nordeste e Sudeste. As principais atividades exercidas estão na agropecuária, no comércio e no setor de serviços, muitas delas enquadradas entre as piores formas de trabalho infantil, como o trabalho ao ar livre sem proteção e em vias públicas.
No caso específico do trabalho infantil doméstico, que atingiu cerca de 77 mil crianças e adolescentes em 2023, o perfil muda: 82% são meninas e 62% negras, evidenciando a dimensão de gênero e raça dessa forma de exploração.
Papel da Fiscalização
O diagnóstico da OIT ressalta o papel central da fiscalização do trabalho na identificação e no enfrentamento do trabalho infantil. Essas ações são fundamentais não apenas para cessar a violação, mas também para acionar a rede de proteção social e garantir o encaminhamento das vítimas para políticas de assistência, educação e saúde.
Apesar dos avanços registrados até 2023, dados preliminares do IBGE relativos a 2024 indicam interrupção da trajetória de queda, com aumento para 1,65 milhão de crianças e adolescentes em situação de trabalho infantil, o que afasta o Brasil da meta 8.7 dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS), que prevê a erradicação do trabalho infantil até 2025.
A OIT destaca que o trabalho infantil segue fortemente associado à pobreza e à desigualdade racial e de gênero. A maioria das crianças exploradas vive em domicílios com renda per capita de até meio salário-mínimo e, embora grande parte esteja matriculada na escola, a frequência é inferior à média nacional, o que amplia a vulnerabilidade educacional.
Recomendações
Entre as recomendações apresentadas pelo estudo estão o fortalecimento da Auditoria-Fiscal do Trabalho, com ampliação da fiscalização e apoio das forças de segurança, além do reforço da estrutura dos CRAS e CREAS nos municípios. A OIT também defende a garantia de orçamento permanente para ações de erradicação do trabalho infantil, a produção regular de estatísticas, o fortalecimento da aprendizagem profissional inclusiva e a ampliação das políticas de proteção social para famílias vulneráveis.
Para o presidente do SINAIT, Bob Machado, os dados reafirmam a relevância da atuação dos Auditores-Fiscais do Trabalho como agentes essenciais na proteção da infância e adolescência. “O reforço, com 900 novos Auditores-Fiscais do Trabalho, é fundamental para ampliar a capacidade de fiscalização, fortalecer o combate ao trabalho infantil e a outras formas de exploração do trabalho”.