Com críticas ao trabalho escravo e a reforma trabalhista, escola ficou em segundo lugar no Carnaval 2018. Mas o público elegeu a Tuiuti como a vencedora
Com quase 130 anos da abolição da escravidão, será mesmo que foi abolida? É o que pergunta o enredo da Paraíso do Tuiuti, escola de samba que ficou em segundo lugar no Carnaval 2018, do Rio de Janeiro.
Carregado de críticas sociais, o desfile da Paraíso do Tuiuti contou a história da escravidão, desde a antiguidade até os dias atuais com o enredo “Meu Deus! Meu Deus! Está extinta a escravidão?”. Dessa forma, a escola mostrou as consequências sociais das práticas escravagistas, a existência do uso do trabalho escravo que persiste em vários setores de produção econômica e a fragilidade das relações trabalhistas.
Com 29 alas, a escola explorou o tema das mais diversas formas, representando o trabalho escravo rural, o tráfico de escravos, o trabalho informal e relembrando a publicação do primeiro jornal da imprensa negra no Brasil, “o Mulato”, em 1833.
Na ala “Os Guerreiros da CLT”, a escola explorou a sobrecarga dos trabalhadores. Os passistas vieram segurando carteiras de trabalho e artefatos em vários de seus braços. Em fantasias e alegorias, operários obrigados a se desdobrar denunciavam as más condições de trabalho e criticavam a reforma trabalhista. Carteiras rasgadas também mostravam a falta de direitos no trabalho informal.
Na ala “Manifestoches”, a Tuiuti ironizou os manifestantes que pediram o impeachment da presidenta Dilma. Os passistas vieram à avenida segurando panelas e envoltos em patos que faziam menção à campanha da Fiesp “Não vou pagar o pato”. As mãos que pendiam sobre as cabeças de cada um, os colocavam como manipulados. Como destaque o "vampiro neoliberalista", que vestia a faixa presidencial, numa alusão ao presidente Michel Temer.
Com uma melodia de encantar, a escola levantou o público na Sapucaí com um samba enredo que ficou entre os melhores do ano. O samba de Claudio Russo, Moacyr Luz e parceiros mostra que a sociedade ainda não está livre das mazelas sociais e políticas. O desfile foi bastante comentado e elogiado nas redes sociais. A escola chegou a ser trending topics no Twitter..
No voto popular, a Paraíso do Tuiuti é a vencedora do Carnaval 2018.
Clique aqui para ver a íntegra do desfile.
Confira a letra do Samba-enredo:
Irmão de olho claro ou da Guiné
Qual será o valor? Pobre artigo de mercado
Senhor eu não tenho a sua fé, e nem tenho a sua cor
Tenho sangue avermelhado
O mesmo que escorre da ferida
Mostra que a vida se lamenta por nós dois
Mas falta em seu peito um coração
Ao me dar escravidão e um prato de feijão com arroz
Eu fui mandinga, cambinda, haussá
Fui um rei egbá preso na corrente
Sofri nos braços de um capataz
Morri nos canaviais onde se planta gente
Ê calunga! Ê ê calunga!
Preto Velho me contou, Preto Velho me contou
Onde mora a sengora liberdade
Não tem ferro, nem feitor
Amparo do rosário ao negro Benedito
Um grito feito pele de tambor
Deu no noticiário, com lágrimas escrito
Um rito, uma luta, um homem de cor
E assim, quando a lei foi assinada
Uma lua atordoada assistiu fogos no céu
Áurea feito o ouro da bandeira
Fui rezar na cachoeira contra bondade cruel
Meu Deus! Meu Deus!
Se eu chorar não leve a mal
Pela luz do candeeiro
Liberte o cativeiro social
Não sou escravo de nenhum senhor
Meu Paraíso é meu bastião
Meu Tuiuti o quilombo da favela
É sentinela da libertação