As ameaças sofridas por vários Auditores-Fiscais do Trabalho, bem como as tentativas de interferências políticas para impedir o trabalho da fiscalização foram denunciadas pela presidente do Sinait, Rosa Jorge
Comissão aprovou Moção de Repúdio contra as interferências sofridas pela fiscalização do trabalho e outras propostas apresentadas por Rosa Jorge
As ameaças sofridas por vários Auditores-Fiscais do Trabalho, bem como as tentativas de interferências políticas para impedir o trabalho da fiscalização foram denunciadas pela presidente do Sinait, Rosa Jorge, na reunião da Comissão Nacional para a Erradicação do Trabalho Escravo – Conatrae, nesta quinta-feira, 18 de dezembro, em Brasília.
Rosa Jorge fez um relato das várias ameaças sofridas por colegas durante as fiscalizações e disse que o ano de 2014 foi atípico. “Nunca em um mesmo ano a fiscalização sofreu tanta tentativa de intimidação”, desabafou a presidente do Sinait, que citou entre os ocorridos o caso de uma Auditora-Fiscal ameaçada dentro da sede do Ministério do Trabalho e Emprego em Unaí/MG, as ameaças recebidas por Auditores-Fiscais que atuam em Barreiras/BA, no Mato Grosso e no Acre, além da interferência política para descumprir a interdição feita por Auditores-Fiscais na unidade de saúde pública do Centro de Assistência Integral à Saúde - CAIS/GARAVELO, no município de Aparecida de Goiânia, em Goiás.
O caso mais recente de ameaça foi o do Auditor-Fiscal do Trabalho Thiago Barbosa. Ele foi seguido por um veículo durante o trajeto de sua residência até a Superintendência Regional do Trabalho e Emprego – SRTE/AC, depois de uma ação que resgatou 15 trabalhadores em uma fazenda em Rio Branco (AC). Thiago também foi fotografado em um restaurante onde estava na companhia de sua família.
De acordo com Rosa Jorge, o caso está sendo investigado pela Polícia Federal e pela Procuradoria Regional do Trabalho - PRT da 14ª Região, que recentemente criou a Comissão Regional de Investigação e Combate ao Trabalho Escravo para tomar as medidas necessárias para acompanhar esta ocorrência. Ela também informou que o Sinait protocolou pedido de providências na Secretaria de Inspeção do Trabalho – SIT.
Durante a reunião, Rosa Jorge criticou a falta de empenho do governo em fortalecer a Fiscalização do Trabalho. Ela disse que a carreira de Auditoria-Fiscal do Trabalho está com um terço dos seus cargos vagos, ou seja, o quadro está reduzido em quase mil servidores, e que os poucos que estão em atividade ainda sofrem interferência indevida. “Quero deixar claro para vocês que os Auditores-Fiscais do Trabalho estão sendo prejudicados. As quatro equipes do Grupo Móvel não estão dando conta de fazer as fiscalizações rurais, e os Auditores-Fiscais que estão fazendo este trabalho estão sendo ameaçados. Temos que fazer o enfrentamento a essas ameaças”, argumentou.
Segundo Rosa Jorge, a impunidade da Chacina de Unaí também contribui para o aumento das ameaças, fazendo com que muitos empregadores achem que têm o direito de fazer o mesmo. “Antes que morra mais gente, precisamos tomar uma atitude”.
Ela citou como exemplo o caso ocorrido em Mato Grosso, onde Auditores-Fiscais sofreram uma ameaça velada feita pelo irmão da senadora Kátia Abreu, depois que a fiscalização encontrou trabalho escravo em uma de suas fazendas.
Diante dos fatos expostos, Rosa Jorge cobrou uma postura da Conatrae. Ela sugeriu e foi aprovada uma Moção de Repúdio às práticas de ameaças à fiscalização e contra as interferências indevidas no trabalho dos Auditores-Fiscais. A Conatrae vai divulgar a Moção nos próximos dias.
Sobre o caso do Mato Grosso, Alexandre Lyra, chefe da Divisão de Erradicação do Trabalho Escravo – Detrae, da SIT, informou que a Polícia Federal instaurou inquérito para apurar as ameaças feitas pelo irmão da senadora Kária Abreu aos Auditores-Fiscais do Trabalho de Mato Grosso.
Semana Nacional de Combate ao Trabalho Escravo
O Sinait realiza no dia 28 de janeiro de 2015, ato público em frente ao Supremo Tribunal Federal - STF para lembrar os onze anos da Chacina de Unaí, ocasião em que vai cobrar o julgamento dos envolvidos no crime. O evento vai integrar o calendário de atividades da Semana Nacional de Combate ao Trabalho Escravo da Conatrae, que acontece entre a última semana de janeiro e a primeira de fevereiro, com ações por todo o país.
Por isso, a Conatrae vai marcar sua primeira reunião anual de 2015 para o dia 27 ou 28 de janeiro, para que todas as entidades integrantes da Comissão enviem representantes para a mobilização organizada pelo Sinait.
Oficinas e debates também estão previstos para marcar o Dia Nacional de Combate ao Trabalho Escravo, celebrado em 28 de janeiro. Assim como em 2010, 2011 e 2012, as atividades estão programadas em vários Estados para chamar atenção sobre o problema e mobilizar por avanços na erradicação do trabalho escravo contemporâneo.
Entre as atividades previstas pela Conatrae para 2015 está a assinatura de um Acordo de Cooperação Técnica entre o MTE e o Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome – MDS, que prevê assistência ao trabalhador resgatado do trabalho escravo.
O dia 28 de janeiro foi oficializado como Dia Nacional de Combate ao Trabalho Escravo como uma forma de homenagear os Auditores-Fiscais do Trabalho Nelson José da Silva, João Batista Lage e Eratóstenes de Almeida Gonçalves, e o motorista Aílton Pereira de Oliveira, assassinados nesta data em 2004, durante fiscalização na zona rural de Unaí - MG. No mesmo dia é também comemorado o Dia do Auditor-Fiscal do Trabalho.
Projetos de lei
Projetos de Lei que estão tramitando no Congresso Nacional e que prejudicam o trabalhador foram destacados durante a reunião da Conatrae. O PLS 432/2014 que regulamenta a Emenda Constitucional 81, de 2014, que dispõe sobre a expropriação das propriedades rurais e urbanas onde for comprovada a exploração de trabalho escravo, foi um deles.
O principal objetivo do projeto é alterar o conceito de trabalho escravo, retirando os termos “jornada exaustiva” e “trabalho degradante”, para beneficiar os infratores deste tipo de crime e, como consequência, limitar a atuação da Fiscalização do Trabalho.
Outro que precisa ser combatido é o PLS 236/2012, que trata da reforma do Código Penal. O projeto acatou a emenda apresentada pelo senador Blairo Maggi (PR/MT), trazendo o texto do PLS 432 para o art. 154 do Código (antigo art. 149), que conceitua o trabalho escravo.
Já o PL 4.330/2004, que legaliza a contratação de prestadoras de serviços para executarem atividades-fim em uma empresa, foi questionado pela presidente do Sinait. A proposta precariza as relações de trabalho e consequentemente favorece o trabalho degradante.
Rosa Jorge alertou para o perigo da legalização da figura do “gato”, intermediador de mão de obra escrava rural, caso este projeto seja aprovado. ”Se aprovado, pode colocar por terra todo o combate ao trabalho escravo que estamos fazendo. No ano que vem este projeto deve voltar com força e vai legalizar a figura do gato tomador de serviço”.
A Conatrae vai fazer Nota Técnica alertando para o perigo que todas essas propostas representam, tanto para o trabalhador como para a sociedade em geral.
Ainda no âmbito do Legislativo, Rosa Jorge lembrou o relatório da Comissão Parlamentar de Inquérito – CPI do Trabalho Infantil, aprovado na semana passada. O texto recomendou ao governo o fortalecimento da Inspeção do Trabalho para combater o problema que atinge mais de 3,5 milhões de crianças, pois entende que o trabalho infantil é o início da escravização da pessoa, que se perpetua no adulto.
Apoio aos migrantes
A presidente do Sinait pediu o empenho da Conatrae para apoiar a ratificação da “Convenção Internacional sobre a Proteção dos Direitos de Todos os Trabalhadores Migrantes e dos Membros das suas Famílias”. O instrumento foi adotado pela Resolução 45/158 de 1990, pela Organização das Nações Unidas.
De acordo com Rosa Jorge, a Convenção contém dispositivos que irão proteger os trabalhadores migrantes que chegam ao Brasil e são explorados, sendo vítimas do trabalho escravo. “O número de estrangeiros que têm entrado no Brasil para trabalhar tem aumentado significativamente, bem como os resgates desses trabalhadores pelos Auditores-Fiscais do Trabalho”, informou.
Neste sentido, os integrantes da Conatrae aprovaram a elaboração de uma minuta de texto, que será finalizada pelo Sinait e pela Comissão Pastoral da Terra – CPT, para que a Comissão leve para o governo brasileiro a proposta de ratificação da Convenção, e assim iniciar a luta para legalizar mais este instrumento de proteção ao trabalhador.
Filme pureza
A proposta de um longa metragem que relata a saga de uma mãe, camponesa, mulher simples, em busca do filho, recrutado para o trabalho escravo e desaparecido, foi apresentada na reunião da Conatrae pelo cineasta Renato Barbieri.
Renato está divulgando o filme que se chamará “Pureza”, nome da mãe do trabalhador desaparecido, e começa a ser rodado no segundo semestre de 2015 com previsão de estrear nos cinemas brasileiros no início de 2016.
O cineasta veio pedir o apoio das entidades que integram a Conatrae para promover a execução e divulgação do filme.
O cineasta já estreitou o contato com o Sinait para conhecer mais o trabalho do Auditor-Fiscal, para que sua atuação seja relatada com veemência no filme.
Acompanharam também a reunião na Conatrae nesta quinta-feira, o vice-presidente do Sinait, Carlos Silva, os diretores Sebastião Estevam e Valdiney Arruda e a Auditora-Fiscal do Trabalho Jacqueline Carrijo.