Por Solange Nunes
Edição: Nilza Murari
O vice-presidente da Delegacia Sindical do SINAIT em Goiás, Rogério Silva, disse que a diminuição da proteção do trabalho e a redução das normas de saúde e segurança no trabalho vão trazer prejuízos enormes para a sociedade brasileira. A explanação ocorreu durante audiência pública, com foco no “Direito do Trabalho”, nesta segunda-feira, 24 de junho, na Comissão de Direitos Humanos e Legislação Participativa – CDH do Senado, em Brasília (DF). As colocações dos especialistas foram mediadas pelo presidente da CDH, senador Paulo Paim (PT/RS).
De acordo com Rogério Silva, os direitos do trabalhador e as normas de saúde e segurança no trabalho estão sob ataque. Nesta linha, contextualizou os argumentos por meio da história recente do país, que sofreu rupturas institucionais e governamentais, provocou a desproteção do trabalho e aumento do desemprego. Ele constatou, como Auditor-Fiscal do Trabalho, em ações nas empresas, que a diminuição dos direitos do trabalhador afetou os empregados, o poder de renda e suas famílias.
Dentre os inúmeros prejuízos, analisou a mudança de governo, em 2017, que ocasionou a mudança de nomenclatura do então Ministério do Trabalho e Emprego (MTE), que passou a se chamar apenas Ministério do Trabalho. “A retirada da palavra ‘emprego’ era um prelúdio para muitas mudanças que não esperávamos”.
Ele fez ainda um paralelo entre ‘trabalho e emprego’. O trabalho é uma atividade profissional regular – qualquer tipo de trabalho. O emprego é uma ocupação em serviço público ou privado; cargo ou função sob a proteção da Consolidação das Leis do Trabalho – CLT que tem um manto da legislação que o protege. Neste contexto, avaliou que a retirada da palavra ‘emprego’ do Ministério sinalizou um desmonte sem precedentes da proteção social do trabalho.
Após a mudança de nomenclatura, dois anos depois o Ministério do Trabalho foi extinto por meio da Medida Provisória 870/2019. A medida modificou a estrutura administrativa da Presidência da República e dos Ministérios. “Depois de 85 anos, o Ministério do Trabalho foi extinto, pela primeira vez, a pasta que já foi considerada a mais importante do governo”.
Ele enfatizou que a extinção do órgão e a reforma trabalhista – Lei nº 13.467/2017 – trouxeram repercussões sérias para o mundo do trabalho no Brasil. Destacou também que a MP 870/19 rebaixou a Secretaria de Inspeção do Trabalho (SIT) – órgão federal responsável pela fiscalização das relações de emprego e de trabalho no país –, para uma subsecretaria, dentro do Ministério da Economia. “A mudança, entre outros prejuízos, provocou a redução do orçamento – verba pública – destinada para a SIT. Além da redução das ações fiscais”.
Rogério Silva esclareceu ainda que as agências e gerências do trabalho – pontos de atendimento aos trabalhadores –, ramificações do extinto Ministério do Trabalho, em algumas cidades e municípios menores, estão sendo extintas. “Os trabalhadores recebiam atendimentos, tiravam dúvidas sobre a legislação trabalhista, faziam denúncias e agora vão ficar desassistidos”.
O Auditor-Fiscal informou que o Brasil foi denunciado à Organização Internacional do Trabalho – OIT por violar as Convenções da OIT e não tem garantido o cumprimento da Convenção 81 que trata da independência da Inspeção do Trabalho. O documento recomenda uma Inspeção do Trabalho independente financeira e administrativamente. “A partir do momento que a Inspeção do Trabalho é rebaixada para uma subsecretaria no Ministério da Economia, perde parte de sua autonomia, independência e recursos financeiros, significa que está sendo desrespeitada no Brasil”.
Ele argumentou ainda que a diminuição do número de Auditores-Fiscais do Trabalho já foi denunciada várias vezes pelo SINAIT. Lembrou o estudo do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada – Ipea realizada, em 2012, em parceria com o SINAIT, que recomenda mais de oito mil Auditores-Fiscais do Trabalho no país.
Reforma trabalhista
O delegado sindical lembrou a participação do SINAIT em várias audiências públicas, palestras e reuniões na Câmara dos Deputados e no Senado repudiando a reforma trabalhista e denunciando os malefícios que a proposta traria para o mundo do trabalho. Disse também que no início do debate sobre a reforma trabalhista falava-se em alterar apenas oito pontos, depois 13; a matéria foi aprovada alterando mais de 100 regras trabalhistas. “Os pontos alterados não faziam parte do texto original CLT de 1943, como se alegava na época”.
Ele disse que o Sindicato Nacional lutou contra as alterações na legislação trabalhista, que estavam sendo promovidas sob o pretexto de que era arcaica, antiga e antiquada. “Depois da aprovação, estamos voltando ao Século XIX. A desproteção do mundo está chegando num nível tão extremo que estamos voltando ao período pós-revolução industrial”.
A situação, para ele, ainda pode piorar. “Agora está em debate a redução de até 90% das normas de saúde e segurança do trabalho”. A redução, no cenário atual, em que o Brasil está em quarto lugar mundial no número de acidentes de trabalho é extremamente preocupante. “A redução das normas de saúde e segurança no trabalho provocará o aumento no número de acidentes. Afinal, as normas existem para proteger o trabalhador e o ambiente de trabalho e evitar que os acidentes aconteçam”.
O Brasil amarga um recorde histórico de quase 700 mil acidentes de trabalho/ano. “É um número assustador. Ao invés de se pensar em retirar a proteção do trabalhador, deveria aumentá-la. Há os argumentos de que as normas de segurança travam a economia. Isso não é a realidade. As normas buscam garantir a saúde e a segurança no ambiente de trabalho”.
Lembrou ainda que as normas foram elaboradas por uma Comissão Tripartite, que hoje também foi extinta. “As normas na Comissão Tripartite eram constantemente debatidas e atualizadas. A comissão era integrada pelo governo, por representantes dos empregadores e dos empregados. Significa que as normas que estão em vigor foram alteradas e aprovadas também pelos empregadores. Por isso, não há porque extinguir 90% das normas de saúde e segurança no trabalho”.
O delegado sindical disse que a situação do trabalhador pode piorar, caso a reforma da Previdência – PEC 6/2019 – seja aprovada. “A reforma da Previdência aprofunda a reforma trabalhista porque há tópicos dentro da proposta que influenciam diretamente o mercado de trabalho. São vários casos de direitos que estão sendo solapados dentro da reforma previdenciária”.
MP 873/2019
O Auditor-Fiscal do Trabalho falou também da Medida Provisória 873/2019, editada em 1º de março, que retira o desconto de mensalidades sindicais em folha de pagamento e determina que ocorra apenas por meio de boleto bancário. “A medida prejudica a arrecadação dos sindicatos, portanto, suas ações em prol do trabalhador e da categoria”. Dificulta também a negociação dos sindicatos com os empregadores. “A medida provoca o esfacelamento dos sindicatos e diminui a força de resistência e luta pela categoria frente aos empregadores”.
Chamou a atenção sobre a importância de investir no mercado de trabalho, por conseguinte, no crescimento do país. “A economia só funciona se o trabalhador tiver como consumir. Se você tirar o direito do trabalhador de consumir, como a economia vai girar?”. Declarou que retirar a proteção social do trabalho não gerou mais emprego, apenas aumentou o desemprego. “A lógica perversa de tirar o direito do trabalhador significa apenas maior concentração de renda no país”.
Ao final, Rogério Silva disse que a diminuição da proteção do trabalho e a redução das normas de saúde e segurança no trabalho vão trazer prejuízos enormes para a sociedade brasileira. Lembrou da participação do SINAIT na elaboração do Estatuto do Trabalho, Sugestão nº 12/2018. “É uma proposta alternativa para um mercado de trabalho sadio, logo, uma economia saudável para que o Brasil volte a crescer e se desenvolver”.
A fala do Rogério Silva em defesa do trabalho decente foi reforçada pelos especialistas Eidy Lian Cabeza, coordenadora regional no Estado de São Paulo do Movimento da Advocacia Trabalhista Independente –MATI; Nicola Manna Pirano, diretor de Relações Institucionais do MATI; Luiz Antônio Colussi, Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho – Anamatra e Cristiano Paixão, subprocurador-geral do Trabalho.