Por Dâmares Vaz
Edição: Nilza Murari
Após ser processada pelo Ministério Público do Trabalho – MPT, em ação civil pública da Procuradoria Regional do Trabalho da 1ª Região que pede R$ 70 milhões por danos morais coletivos, a rede de churrascarias Fogo de Chão irá pagar as verbas rescisórias devidas a 690 empregados demitidos. A empresa havia se recusado a quitar as obrigações trabalhistas sob alegação de que as demissões, em plena crise causada pela pandemia da Covid-19, teriam sido causadas pelo fechamento dos negócios em razão dos decretos de quarentena editados por prefeitos e governadores, e que então seriam eles os responsáveis pelo pagamento dos valores.
A empresa amparou sua alegação no art. 486 da Consolidação das Leis do Trabalho – CLT, que embasa a tese denominada Fato do Príncipe. Segundo o artigo, caberia ao governo o pagamento da indenização aos empregados demitidos quando a paralisação temporária ou definitiva do trabalho tiver sido motivada por ato de autoridade municipal, estadual ou federal, ou pela promulgação de lei ou resolução que tenha impossibilitado a continuação da atividade.
Dias antes de anunciar que iria pagar os empregados demitidos, a rede pediu à Justiça do Trabalho que fosse estabelecido sigilo na ação civil do MPT, o que foi negado pela juíza do trabalho substituta Ana Larissa Lopes Caraciki. A justiça ainda não se debruçou sobre os pleitos do MPT na ação, como o dano moral coletivo, a reintegração dos funcionários demitidos, a indenização no valor de 4 vezes o salário de cada empregado e a manutenção do plano de saúde, mas a Fogo de Chão decidiu quitar de uma vez as obrigações trabalhistas.
A empresa deverá arcar ainda com uma multa pelo atraso no pagamento das verbas rescisórias e com indenização por eventuais danos sofridos pelos empregados por não terem recebido seus direitos.
Operadores do Direito do Trabalho, como Auditores-Fiscais do Trabalho e magistrados, analisam que a aplicação da teoria enfrenta obstáculos. Para o Auditor-Fiscal do Trabalho Luis Alves de Freitas Lima, autor da publicação Direitos trabalhistas durante a pandemia causada pela Covid-19, o Fato do Príncipe somente ficará configurado caso se comprove que a administração pública dispunha de diversas alternativas e utilizou justamente aquela que prejudicou os negócios, de forma definitiva.
“O dano deve ser específico à empresa, ao contrário do que ocorre nessa situação de pandemia, em que o dano é partilhado por toda a sociedade. Mesmo assim, se a empresa conseguisse confirmar a ocorrência da teoria, predomina o entendimento de que o Poder Público deve pagar somente a multa do FGTS”, explicou Luis Alves.
O ministro do Tribunal Superior do Trabalho – TST Alexandre Agra Belmonte também avaliou que o dispositivo é inaplicável. "Não foi ele (governo) o causador. O causador foi o vírus", disse.
Apesar da decisão da empresa, a ação segue tramitando na Justiça do Trabalho, uma vez que a demissão foi feita de forma irregular.