“Hoje deveria ser um dia de comemoração em homenagem ao Dia do Auditor Fiscal do Trabalho, mas infelizmente é um dia de tristeza, porque mais uma vez estamos reunidos para pedir celeridade no julgamento dos acusados pelo assassinato dos colegas Eratóstenes, João Batista, Nelson e Ailton." Foi com esse tom de indignação, que a presidente do SINAIT, Rosângela Rassy, deu início a seu discurso, durante manifestação, esta manhã, em Ato Público realizado em frente ao Supremo Tribunal Federal.
"Estamos aqui para exigir o julgamento dos acusados dos crimes ocorridos em Unaí. Eles são os coronéis do século 21 e têm usado de diversos subterfúgios para retardar os processos", disse Rosângela. “Que país é esse em que quatro servidores públicos são assassinados e até hoje não houve punição para os nove envolvidos?” indignou-se a presidente. E acrescentou: “Os acusados de serem os mandantes do crime estão em liberdade e continuam vivendo normalmente, inclusive um deles é prefeito no município de Unaí. A indignação é muito grande. O crime mudou a vida de todos nós, Auditores Fiscais do Trabalho. O temor por que passa toda a categoria é grande, pois as condições de trabalho não mudaram e continuamos sem segurança. A Polícia Federal nos acompanha somente em algumas situações, mas também não possui efetivo suficiente. É muito difícil para todos nós a cada dia em que entramos no carro do Ministério e saímos para uma ação de fiscalização rural”.
O Ato Público reuniu cerca de 200 pessoas, entre AFTs, familiares dos AFTs assassinados, autoridades, representantes de entidades e de centrais sindicais. Todos vestiam camisetas, usavam bonés e seguravam cartazes e faixas pedindo “Julgamento Já” para os acusados da chacina. Cinco mil balões pretos revoaram sobre o prédio do STF e chamaram a atenção das pessoas que circulavam próximas ao local do evento. Principalmente, dos servidores públicos que trabalham nos prédios que circundam a Praça dos Três Poderes, onde estão localizados, além do STF, o Palácio do Planalto, o Palácio da Justiça, o Congresso Nacional e alguns Ministérios.
A presidente do SINAIT informou aos presentes que esse é o primeiro ano em que há censura nas atividades promovidas pelo Sindicato Nacional. “Dentre os materiais confeccionados para o Ato Público, um front light (painel luminoso) colocado na saída do Aeroporto Internacional de Brasília, teve a frase “Chacina de Unaí - 6 anos de impunidade” censurada pela Infraero, que controla os espaços de publicidade do local. Fomos obrigados a mudar para “Em respeito ás vítimas de Unaí”. A justificativa pela censura, segundo a Infraero, é de que se tratava de mensagem de conteúdo político-partidário. Isso demonstrou que o Estado sabe que está nos devendo o julgamento dos acusados”, ponderou. “Não vamos ficar calados diante desta arbitrariedade, deste ato de censura. O SINAIT não tem qualquer envolvimento político-partidário. E dizer que aquele crime não foi uma chacina é tapar o sol com a peneira”, disse a presidente.
Referindo-se à Semana de Combate ao Trabalho Escravo, o senador José Nery, que também é presidente da Subcomissão de Combate ao Trabalho Escravo no Senado Federal, lembrou que a data foi escolhida em homenagem aos AFTs assassinados. “Esse dia nacional, que ocorre pela primeira vez este ano, é um marco na retomada da mobilização social e da luta pela erradicação do trabalho escravo no Brasil. É sempre difícil combater o poder econômico e político ligado a essa prática criminosa. Mas o mais triste é constatar que algumas autoridades ignoram essa realidade e fazem pouco caso dos que defendem o combate ao trabalho escravo”. O senador destacou a importância do trabalho dos AFTs no combate ao trabalho escravo.
A exigência da retomada dos processos é também o desejo dos parentes das vítimas, como o caso de Elba Soares e Genir Lage, viúvas dos AFTs, Nelson José da Silva e João Batista Soares Lage, respectivamente. Segundo Genir, a falta de punição causa indignação a todas as famílias. "A impunidade deixa um sentimento de impotência. Meus filhos e eu nos sentimos prisioneiros. Só quem vive os bastidores de uma dor pode entender o que digo", afirmou.
O representante da Confederação Iberoamericana e vice-presidente do SINAIT, Sylvio Barone, disse que os Inspetores do Trabalho da Argentina, Uruguai, Paraguai, Peru, Espanha e do Brasil apoiavam a manifestação e se solidarizavam com os colegas lamentando a demora no julgamento. "O atraso na entrega da prestação jurisdicional implica na negação da própria justiça", lembra Barone. Ele reiterou o pedido pela agilização no julgamento.
No protesto, os manifestantes pediram também agilidade do Congresso para votação da PEC 438, conhecida como a PEC do Trabalho Escravo. A proposta lembrada na maioria das falas dos presentes, determina que sejam expropriadas as terras onde for encontrado trabalho escravo. A PEC está parada na Câmara desde 2004 por pressão da bancada ruralista. Os ruralistas argumentam que a definição do que é trabalho escravo não está clara na legislação brasileira.
“Essa PEC é um grande símbolo, porque vai atacar a propriedade privada, que é tão cara para esses que têm trabalho escravo em suas terras. É inaceitável que ainda não tenha sido votada. Dizer que a definição de trabalho escravo não está clara, isso não é verdadeiro. A legislação traz parâmetros claros do que vem a ser o trabalho escravo”, considerou o procurador do Trabalho Sebastião Caixeta, representante da Coordenação Nacional de Erradicação do Trabalho Escravo (Conaete) do Ministério Público do Trabalho.
As intervenções dos sindicalistas representantes da CUT, Conlutas, Sindicato dos Trabalhadores da Indústria da Construção Civil foram na mesma direção: pediram justiça, agilidade no julgamento e punição para os culpados. Todos repudiaram a violência contra agentes do Estado no cumprimento do dever e externaram a solidariedade de todos os trabalhadores para com os AFTs. O assassinato dos AFTs, segundo eles, atinge todos os trabalhadores. “A condenação dos culpados não trará de volta os companheiros assassinados, mas encerrará um ciclo de impunidade”, reiterou Cosme Balbino da CUT.
A Vice-presidente do SINAIT, Carmen Cenira, emocionada, leu um texto em que disse que Unaí é para toda a sociedade um divisor de águas. “Lembro-me muito bem há 6 anos nesta mesma data, ouvi a notícia pelo rádio do carro daquele crime horrendo, assustador, quando retornava de uma ação fiscal no litoral sul do estado de São Paulo, denominada de “Operação Verão”. Ao ouvir o noticiário quase não acreditei! Havia algo de errado sendo veiculado pelo rádio! Infelizmente era a mais pura verdade”, lembrou.
No encerramento, o AFT Carlos Dias, que conduziu o Ato, agradeceu a presença de todos e reiterou os pedidos de justiça para os crimes e de segurança para os AFTs, que continuam na luta diária arriscando suas vidas.
Dentre as várias autoridades e representantes de entidades que participaram do evento, registramos as presenças do ex-secretário de Direitos Humanos da Presidência da República, Nilmário Miranda; do diretor-adjunto de Defesa Profissional do Sindifisco Nacional, Dagoberto Silva Lemos ; da vice-presidente da ANPT, Daniela Landin; do representante da ANPT na Conatrae, Maurício Melo; da chefe da divisão de Trabalho Escravo, Giuliana Orlandi Cassiano; do presidente do Sindicato dos trabalhadores Rurais do DF, Aécio Fernandes ; do coordenador sindical da Associação dos servidores e Técnicos de Transporte do Ministério Público, Laércio Bernardes dos Reis; do Secretário-Executivo da Conlutas/DF, Robson da Silva; do presidente do PSol/DF, Antônio Carlos; do secretário de Imprensa da CUT/DF, Cosme Balbino; da presidente do PSol/PA, Marinor Brito; do presidente da Confederação Iberoamericana e vice-presidente do SINAIT, Francisco Luís Lima; do diretor do Sindicato dos Trabalhadores da Indústria da Construção Civil, João Barbosa; das presidentes das Associações dos Auditores Fiscais do Trabalho de Goiás e Minas Gerais, Marina Eudes Camilo e Socorro Brandão, respectivamente e do presidente do Sindicato dos Auditores Fiscais do DF, Luiz Schwartz.