Colunista de SC critica combate ao trabalho infantil


Por: SINAIT
Edição: SINAIT
21/06/2011



21-6-2011 – Sinait

 

O Sinait recebeu de Auditores-Fiscais do Trabalho de Santa Catarina cópia de notas publicadas no jornal Diário do Iguaçu, nos dias 16, 17 e 21 de junho, assinadas pelo colunista Raul Sartori, em que a fiscalização do trabalho de crianças e adolescentes na colheita de cebola foi criticada. As notas foram enviadas também para a Secretaria de Inspeção do Trabalho - SIT e outras autoridades.

 

A agressão começa pelos títulos das notas, não reflete a verdade e dá seguimento a uma história de hostilidades dos produtores da região de Ituporanga em relação aos Auditores-Fiscais do Trabalho que fazem fiscalização rural. Desde 2007 acontecem ameaças e constrangimentos à fiscalização, com apoio ou, no mínimo, omissão do poder público local. Várias ações de fiscalização sequer puderam ser concluídas em razão de clima de tensão e intimidação real às equipes. As tentativas de diálogo não obtiveram bons resultados. As autoridades estaduais e federais estão cientes do que acontece na região.

 

“A luta que a fiscalização do trabalho trava é pelo fim dos aliciamentos de trabalhadores, a busca por condições dignas de alojamento e de trabalho e o fim da exploração de menores“. Esses são trechos do Relatório de Fiscalização, datado de dezembro /2010, do grupo de Auditores-Fiscais do Trabalho que vêm combatendo a exploração de trabalhadores, especialmente menores, em plantações de cebola no estado de Santa Catarina. Naquela ocasião, o SINAIT enviou o Relatório  circunstanciado elaborado pelo Grupo de Fiscalização Rural de Santa Catarina, em que são relatadas ameaças sofridas pelos Auditores durante as ações fiscais  para a Presidência da República,  o Ministério Público Federal, Ministério Público Estadual, Ministério Público do Trabalho, Polícia Federal e Polícia Estadual, além da Secretaria de Inspeção do Trabalho. Os riscos enfrentados pelos Auditores Fiscais do Trabalho ficam evidenciados em relatos como esses.

 

A defesa do trabalho infantil, sem medir as circunstâncias em que ocorrem, especialmente na área rural, desconsideram as reais condições de trabalho enfrentadas por crianças e adolescentes envolvidas nessa situação.

 

Em relação às notas publicadas, o colunista parece desconhecer o “be-a-bá” dos direitos das crianças e dos adolescentes, não só em nível nacional como também na esfera internacional. Os Auditores-Fiscais do Trabalho cumprem a lei, que proíbe o trabalho de adolescentes antes dos 16 anos, salvo na condição de aprendiz, a partir dos 14 anos. Colheita de cebola não se enquadra no rol de atividades para o aprendizado. E o manuseio das ferramentas cortantes torna a atividade inapropriada para adolescentes menores de 18 anos, pois está inserida entre as piores formas de trabalho infantil. É trabalho pesado, coisa para adulto. Não contribui para a formação de ninguém.

 

O Sinait encaminha documento ao Ministério do Trabalho e Emprego solicitando providências para garantir a segurança necessária aos Auditores-Fiscais do Trabalho do grupo de fiscalização rural em Santa Catarina. Também propõe que seja intensificada a fiscalização na área, concomitante à  orientação e informação junto aos sindicatos patronais e representações de empregadores da região sobre as exigências da lei, independentemente dos contatos com as entidades sindicais de trabalhadores.

 

Abaixo, reproduzimos as notas do jornal Diário do Iguaçu, duas postagens da Auditora-Fiscal do Trabalho Lilian Carlota, no blog do Fórum Estadual de Erradicação do Trabalho Infantil – FETI/SC, além de matéria veiculada pela ONG Repórter Brasil em 21 de janeiro deste ano, contextualizando as dificuldades enfrentadas pelos Auditores-Fiscais do Trabalho na região desde 2007.

 

 

16-6-2011 - Diário do Iguaçu

“Geração de vadios

Coluna Rede com SC, de Raul Sartori

 

É assim que o Brasil está criando uma geração de vadios. Na região de Ituporanga, no Alto Vale do Itajaí, pequenos produtores de cebola veem diluir seu minguado lucro na contratação emergencial de empregados para colher a cebola, lavoura de curtíssima duração, porque não podem ou têm medo de ocupar jovens da própria família. É que o Ministério do Trabalho está fazendo uma fiscalização muito rigorosa, com fiscais acompanhados inclusive por policiais militares. Absurdo isso. Os jovens adolescentes que estão com os pais aprendem uma profissão e formam sua personalidade no convívio com a família; enquadrá-los como mão de obra infantil é um despropósito. Um desserviço.”

 

 

17-6-2011 – Diário do Iguaçu

“Vadios forjados

Coluna Rede com SC, de Raul Sartori

 

Engenheiro em Ituporanga, no Alto Vale do Itajaí, relata, via e-mail, cena que testemunhou ontem numa propriedade rural onde um casal de idosos com mais de 70 anos se curvava na lavoura de cebola, acompanhados do filho casado e cunhada, enquanto três adolescentes entre 12 e 16 anos estavam em casa, vendo TV, porque não tem aulas, já que os professores permanecem em greve. Eles queriam estar lá, ajudando sua família, mas ficaram com medo de flagrante de fiscal do Ministério do Trabalho e provável enquadramento dos avós e pais por "explorar" de mão de obra (sic) infantil. Inacreditável."

 

 

21-6-2011 – Diário do Iguaçu

“TRABALHO

Coluna Rede com SC, de Raul Sartori



A exemplo do que ocorre em Ituporanga, centenas de adolescentes entre 12 e 17 anos, também foram impedidos de trabalhar na colheita de maçã, já concluída, no oeste de SC, por impedimento da legislação trabalhista. Na ociosidade forçada, muitos são atraídos para outras “ocupações”, fora da alçada do Ministério do Trabalho, que cumpre as leis, feitas nos parlamentos. Leis burras.”

 

 

 

20-2-2011 – Blog do FETI/SC

Trabalho infantil no cultivo de fumo – uma das piores formas

 

A Organização Internacional do Trabalho tem manifestado preocupação com a ocupação de crianças e adolescentes no cultivo do fumo. Expressamente proibido para trabalhadores com menos de 18 anos, considerada uma das suas piores formas, produz graves danos à saúde, especialmente intoxicações exógenas, tonturas e vômitos em decorrência da exposição a altos níveis de nicotina, além de câncer e depressão por exposição aos agrotóxicos, afecções músculo-esqueléticas decorrentes do trabalho exaustivo em posições inadequadas, ferimentos e mutilações além da exposição a condições climáticas inadequadas e calor intenso nas estufas..

Além de Santa Catarina, o fumo é produzido no Rio Grande do Sul, Paraná, Bahia e Alagoas. Geralmente em agricultura familiar, em regime de integração com as companhias fumageiras. Embora muitas vezes nos contratos as companhias determinem que o produtor não utilize trabalho infantil, sabe-se que praticamente toda a família participa da atividade, para que a produção seja economicamente viável.

Neste mês de janeiro de 2011, o Grupo de Fiscalização Rural da Superintendência Regional do Trabalho em Santa Catarina com o apoio do Ministério Público do Trabalho e da Policia Federal identificou 24 pessoas em condições precárias de trabalho, na colheita em uma grande plantação de fumo no Município de Rio Negrinho.

Apesar da proibição, 11 desses trabalhadores (6 meninas e 5 meninos) tinham 12 a 15 anos. Assim como aos adultos, não lhes foi fornecido qualquer equipamento de proteção individual obrigatório (sapatos de segurança, bonés árabes para evitar câncer de pele e outros). Alguns estavam descalços, outros com chinelos e os poucos que usavam bonés afirmaram que eram de uso próprio.

Um trator, com uma caçamba acoplada, passava perto das 6 horas da manhã no centro do Município de Vargem Grande e os transportava dentro da caçamba até o local. Trabalhavam até perto das 19 horas, quando retornavam, na caçamba do trator. Chegavam em suas residências perto das 20 horas.

O único sanitário existente era o da casa do produtor. Os adolescentes relataram que geralmente faziam suas necessidades no mato. A água fornecida estava em um galão, mas todos a bebiam no mesmo copo, sujeitando-se a riscos de contaminação por doenças infecto-contagiosas.

No momento da fiscalização 2 trabalhadoras faziam a aplicação do produto Primeplus, altamente perigoso, conforme a própria bula. As empregadas esconderam os aplicadores atrás do chiqueiro de porcos para que a fiscalização não visse que as mesmas faziam a aplicação sem qualquer proteção. Uma delas usava chinelos, e ambas usavam a roupa própria de uso comum, que posteriormente inclusive seria lavada normalmente com as roupas da família, vindo a contaminar também as outras pessoas. As empregadas passavam os agrotóxicos nos locais em que os adolescentes colhiam o fumo e o produtor não possuía qualquer Estudo de Gerenciamento dos Riscos dos Agrotóxicos em relação aos trabalhadores. Não havia local para guarda, armazenamento e preparação da calda do agrotóxico. Também não havia local para higienização dos empregados que aplicavam o agrotóxico.

Constatou-se a outra caçamba que transportava os galões de água e os mantimentos para a alimentação dos empregados junto com os agrotóxicos Primeplus e Agral.

Os empregados adultos não estavam registrados, portanto não amparados pela previdência social em caso de acidentes, doenças ou morte, não tinham sido submetidos a exame médico, não recebiam outros direitos como controle de jornada, repouso semanal remunerado, férias proporcionais, 13o salário proporcional e FGTS.

Os adolescentes, assim como os demais empregados estavam submetidos a condições de risco e sem qualquer proteção ou amparo.

O Conselho Tutelar de Rio Negrinho foi acionado e compareceu para retirar os encaminhar os adolescentes às suas famílias. O empregador foi autuado e notificado para indenizar os direitos dos empregados.




Lilian Carlota Rezende - Coordenadora da Fiscalização do Trabalho Rural em Santa Catarina

 

 

2-2-2011 – Blog do FETI/SC

Trabalho infantil na plantação de cebola em Santa Catarina

 

Neste mês de janeiro de 2011, a Fiscalização Rural da SRTE/SC flagrou 14 crianças e adolescentes (de 7 a 15 anos) na colheita de cebola no Município de Canoinhas. Além deles, 20 adultos trabalhavam sem registro. Aos produtores foi determinado o imediato afastamento das crianças e adolescentes, que foram encaminhados ao Conselho Tutelar para acolhimento pela rede de proteção. Os produtores foram notificados a regularizar de imediato o registro dos maiores e todos os itens de segurança e saúde. Chamou a atenção dos Auditores-Fiscais o menino de apenas 7 anos que, na lavoura, carregava cebolas, sem abrigo do sol e sem banheiro. As crianças e adolescentes não eram filhos dos produtores, moram em bairros pobres da zona urbana. Alegam que têm o que comer em casa, mas precisam de dinheiro para comprar material escolar e outros regalos.




Lilian Carlota Rezende, Coordenadora da Fiscalização Rural

 

 

21-1-2011 – Repórter Brasil

Inspeção do trabalho sofre intimidação em Santa Catarina

Produtores rurais de Ituporanga (SC) protagonizaram ameaças contra a fiscalização trabalhista. Prefeita em exercício chegou a pedir que auditores fiscais do trabalho se retirassem e cancelassem autos de infração e multas

Por Bianca Pyl

 

Fiscalização rural da Superintendência Regional do Trabalho e Emprego de Santa Catarina (SRTE/SC) recebeu ameaças durante inspeções em propriedades de cultivo de cebola, no município de Ituporanga (SC).

Em reunião realizada no início de dezembro do ano passado, a então prefeita em exercício de Ituporanga (SC), Angelita Goedert de Oliveira (PSDB), pediu que a fiscalização trabalhista do governo federal se retirasse da cidade e cancelasse os autos de infração e multas aplicadas.

Duas fiscalizações não puderam ser concluídas por auditores fiscais do trabalho por causa da intimidação de produtores rurais. Em uma delas, houve flagrante de estrangeiros em quadro irregular e, em outra, havia indícios de exploração de mão de obra em condições degradantes, um dos itens que caracterizam o crime de trabalho análogo à escravidão previsto em lei.

Agentes públicos do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE) formaram dois grupos para verificar as condições de trabalho na colheita de cebola nas regiões de Alfredo Wagner (SC) e Ituporanga (SC). "Já no primeiro dia, a situação começou a se desenhar preocupante", relata Lilian Carlota Rezende, coordenadora da Fiscalização Rural da SRTE/SC.

O primeiro grupo, liderado pelo auditor José Márcio Brandão Filho, foi intimidado e recebeu ameaças de produtores contrariados com a ação. De acordo com o relatório elaborado pela fiscalização, o produtor Samuel Mariann, de Alfredo Wagner (SC), chegou a dizer que, se tivesse com uma [arma calibre] 12 dentro da caminhonete, atiraria nos fiscais.

Apesar dos problemas, a equipe liderada por José Márcio conseguiu encontrar cinco trabalhadores argentinos colhendo cebola para o produtor Anderson Bennert. Foram, então, até a casa onde os imigrantes estavam alojados. Houve constatação de várias irregularidades: não havia camas nem armários para guardar objetos pessoais e o fogão ficava no quarto, entre outros problemas. O empregador também se dirigiu ao mesmo local acompanhado de apoiadores. O grupo passou a intimidar os funcionários públicos. Carros foram estacionados em volta do veículo do MTE. Por medida de segurança, a fiscalização teve de deixar imediatamente o alojamento.

No mesmo dia, Lilian recebeu ligação de uma repórter da rádio local (Sintonia) que perguntou se a fiscalização estava sendo realizada, pois havia recebido a informação de que os produtores ateariam fogo no carro do MTE. Diante da situação, ela solicitou reforço à Polícia Federal (PF). "Fiz contato telefônico com a PF em Florianópolis (SC), mas fui informada que não seria possível disponibilizar agentes para apoio", conta a própria.

Na tarde de 7 de dezembro, Angelita, vereadora e então prefeita em exercício, convidou a SRTE/SC para uma reunião. Participaram do encontro o representante dos produtores rurais, e membros das Polícias Civil e Militar, além de outros integrantes da Câmara Municipal de Ituporanga (SC).

No início da reunião, Angelita chegou a declarar que não convidou dirigentes do Sindicato dos Trabalhadores Rurais (STR) porque entendeu que "as pessoas estavam bravas com ele porque achavam que ele fazia denúncias ao Ministério do Trabalho", diz trecho de relatório especial sobre o quadro de intimidação preparado pela SRTE/SC.

Foi nessa reunião, segundo Lilian, que a prefeita em exercício declarou que "em nome dos produtores de Ituporanga, pedia a isenção das multas e a retirada da fiscalização do trabalho".  Caso a fiscalização não aceitasse o pleito, Angelita declarou, ainda de acordo com a auditora Lilian, que "os produtores estavam reunidos e fariam uma manifestação contra a fiscalização que reuniria todos os produtores de cebola, no centro da cidade".

 

Mais intimidação

Por questões de segurança, os auditores optaram por unir os dois grupos em uma só equipe. No dia seguinte (8 de dezembro), a operação continuou. A comitiva de inspeção chegou a avistar um grande número de trabalhadores rurais na estrada, mas a maior parte fugiu imediatamente, assim que percebeu a presença da fiscalização do trabalho.

Foi possível alcançar apenas 15 trabalhadores, que estavam colhendo cebola na propriedade de José Osni Luckmann. Os empregados foram trazidos de outros municípios por meio de aliciamento e estavam alojados, ao que tudo indica, em condições precárias. Eles não tinham registro em carteira e nem equipamentos de proteção individual (EPIs). "De imediato, liguei para a Polícia Militar (PM), informei a nossa localização na Estrada Cerro Negro, e pedi proteção", acrescenta a coordenadora Lilian, da SRTE/SC.

Agentes da PM se deslocaram até o local, mas, nas como relata Lilian, a tentativa de assustar a fiscalização não cessou. "Em pouquíssimo tempo, vários carros começaram a passar na estrada onde estávamos. E, como viam a polícia, não estacionavam. Mas passavam em alta velocidade, criando um clima de intimidação e preocupação", descreve a auditora. 

Nos depoimentos, os trabalhadores disseram trabalhar para o "gato" (aliciador de mão de obra) "Churrisco" e que estariam alojados em casas pela região. O relatório do caso frisa que foi solicitado à PM que acompanhasse a fiscalização até que pudessem alcançar um ponto distante da zona de ameaças. Mas, assim que entraram no bairro Bela Vista, que concentra grande número de produtores de cebola, o carro da Polícia Militar ultrapassou os veículos da fiscalização em alta velocidade. Segundo o já citado relatório, "mesmo a 120 km/h", não foi possível acompanhar as viaturas.

Com isso, a equipe fiscal não pode levar a cabo uma investigação que, conforme previsão de Lilian, "certamente comprovaria a existência de trabalho em condições degradantes por total falta de segurança".

Na sequência, mais precisamente em 8 de dezembro, a própria Angelita (que na ocasião já não exercia mais o cargo de prefeita) e representantes dos sindicatos dos produtores e dos trabalhadores de Ituporanga (SC) se reuniram com o Ministério Público do Trabalho (MPT), em Blumenau (SC). Na ocasião, não houve acordo nem anúncio com relação às resistências enfrentadas pela fiscalização trabalhista federal no município.

As operações do final de ano foram organizadas por conta da constatação, ainda em outra inspeção ocorrida na semana de 12 a 16 de julho de 2010, de que a maioria dos produtores não formalizara vínculos empregatícios com os trabalhadores que atuam nas lavouras da cebola. 

Cópias do relatório sobre o caso foram enviadas ao MPT, ao Ministério Público Estadual (MPE) e ao Ministério Público Federal de Santa Catarina (MPF/SC), além da Secretaria de Inspeção do Trabalho (SIT) do MTE, do INSS e do Sindicato Nacional dos Auditores Fiscais do Trabalho (Sinait).

Na avaliação da auditora fiscal do trabalho Lilian, "não há segurança para que a equipe rural realize fiscalizações na região". O MPF/SC informou que ainda não havia recebido o relatório. A procuradora do MPT em Blumenau (SC), Daniele da Silva Elbert, informou, por meio da secretária, que não comentaria o caso. Disse apenas que a competência para resolver o problema era do MTE. Já o promotor do MPE em Ituporanga (SC) confirmou o recebimento do relatório e promete iniciar uma apuração sobre o caso.

 

Patrões e empregados

Pedro Adriano Damann, secretário-executivo do sindicato rural que representa os produtores, alega que os fiscais foram bem recebidos nas lavouras e houve somente um problema (com os 15 trabalhadores). "Alguns produtores têm dificuldades para registrar os empregados, principalmente porque o período de trabalho é curto e o custo é muito alto", explica.

Segundo Pedro Adriano, as intimidações à fiscalização não partiram do sindicato e nem representam a maioria dos produtores rurais do município. "Foi um grupo isolado e, possivelmente, com apoio de políticos. Nós jamais iríamos pedir para que os fiscais não realizem seu trabalho. O que estamos buscando é conscientizar os produtores e facilitar ao máximo para que eles consigam regularizar a situação trabalhista".

Na visão do presidente do Sindicato dos Trabalhadores Rurais (STR) de Ituporanga (SC), Sebastião Rosa, a lei precisa ser cumprida, independentemente das negociações entre as partes. "Nós já avançamos muito, mas ainda há resistência dos produtores em registrar os empregados", relata. Segundo ele, trata-se de uma contenda antiga.

"A Lei 11.718 permite que o produtor faça um contrato de curta duração e não perca a condição de Segurado Especial [do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS)]. Isso já facilitou muito. Vários produtores viram que era possível regularizar a situação de seus empregados", avalia Sebastião. "Contudo, há um pequeno grupo que ainda resiste em cumprir a lei. Em alguns casos, são justamente produtores maiores e não familiares".

"Se os produtores estão preocupados em perder a condição de Segurado Especial, imagina o trabalhador que só tem a sua força de trabalho para oferecer?", indaga o representante dos trabalhadores.

Há inclusive uma articulação no município para alterar a legislação relativa à contratação de mão de obra rural. Audiência realizada em 10 de novembro de 2010 na Câmara de Ituporanga (SC) decidiu pela organização de um abaixo-assinado pedindo que a lei permita contratos temporários de 240 dias (atualmente são 120) sem a perda do benefício de Segurado Especial, entre outros pontos. A ideia, segundo o secretário-executivo Pedro Adriano, é recolher o máximo de assinaturas e utilizar o documento com as adesões como instrumento de pressão para buscar a alteração legal, juntamente com o apoio de senadores e deputados ruralistas.

Em entrevista à Repórter Brasil, o prefeito de Ituporanga (SC), Osni Francisco de Fragas (PSDB), declarou que não é contra a fiscalização trabalhista, mas sim contra a forma como o procedimento está sendo feito. "Acredito que o agricultor deva ser orientado para que possa se adequar a legislação vigente, e não simplesmente ser multado", opina.

Segundo ele, nenhum vereador é contra a fiscalização. "Todos entendem que possa ser dada uma trégua do Ministério do Trabalho nas notificações e que, ao invés de multar, seja feito um trabalho de orientação e conscientização do agricultor quanto à importância de estar em comum acordo com a legislação", emendou. "Numa época em que o agricultor esta comercializando o produto abaixo do preço de produção e recebe os ficais com o bloco de multa na mão, claro que eles ficam revoltados".



Histórico dos problemas

As dificuldades enfrentadas pela SRTE/SC começaram ainda no final de 2007. Na época, os produtores declararam na rádio local que iriam construir barricadas para impedir a fiscalização trabalhista nas propriedades rurais. O episódio ficou conhecido como "tratoraço". "Houve um clima tenso e foi necessária inclusive a intervenção de representantes do governo e dos produtores. A ação fiscal na colheita de 2007 foi totalmente prejudicada", relembra o relatório que compila informações e dados acerca do caso.

Em 2008, houve uma nova tentativa de fiscalização, com o apoio da Polícia Federal, que não obteve resultados. Na semana escolhida para a operação, não foram encontrados trabalhadores.

A SRTE/SC procurou, em maio de 2009, as lideranças sindicais de produtores e trabalhadores, além da prefeitura e da rádio local, para iniciar um diálogo que visava à conscientização dos direitos dos trabalhadores. "Na oportunidade, a coordenação (da fiscalização rural) procurou o prefeito Osni Francisco de Fragas, que também era o prefeito no ´tratoraço´ de 2007, e pediu que o mesmo apoiasse a fiscalização. Osni disse que não se envolveria com estas questões, que respeitaria o trabalho da fiscalização, mas preferia não se envolver porque entendia não ser o seu papel", coloca o relatório.

Mesmo assim, após algumas reuniões, a SRTE/SC realizou, em junho de 2009, palestra de orientação que contou com a participação de mais de 250 produtores. "E, apesar da tensão, foi possível orientar os produtores presentes sobre as formas de regularização no setor. Nós prometemos que a fiscalização assumiria a posição de orientadora, desde que os produtores demonstrassem que estavam buscando as regularizações propostas", relata Lilian.

Nas primeiras ações de fiscalização, no início de julho de 2009, os fiscais constataram que muitas orientações já vinham sendo seguidas, como a construção de banheiros nos locais de trabalho, o fornecimento de água, e mesmo a manutenção de livros de registro de empregados nas lavouras (para demonstrar a intenção do registro do empregado).

 

Trabalho infantil e escravo

No final de 2009, a fiscalização encontrou crianças e adolescentes realizando a colheita da cebola em Alfredo Wagner (SC). O trabalho é feito com instrumentos cortantes (proibido pela lista das "Piores Formas de Trabalho Infantil", regulamentada pelo Decreto nº 6.481, de 2008).

No mesmo período, a fiscalização libertou 28 trabalhadores, incluindo nove adolescentes, de condições análogas à de escravo, em Imbuia (SC). As vítimas foram aliciadas por Adão de Góes, que inclusive acaba de ser incluído na "lista suja" do trabalho escravo.

Os adolescentes declararam que Adão avisou em bairro pobre de Correia Pinto (SC) que quem desejasse trabalhar na colheita da cebola deveria trazer uma colher, um colchão e comparecer à praça municipal. Os adolescentes foram localizados no meio do mato porque foram obrigados pelo dono da lavoura a fugir. As vítimas declararam que se machucaram durante a fuga. Ficaram lá até escurecer, com fome, frio e machucados.

A fiscalização não conseguiu estabelecer vínculo empregatício com nenhum produtor porque os empregados e o aliciador se recusaram a dar informações à fiscalização. "Como não havia empregador direto para assumir as responsabilidades, optei por responsabilizar o empregador indireto, Adão de Góes", explica Lilian. Ele não pagou as rescisões, mas arcou com as despesas de retorno dos trabalhadores. 

O flagrante gerou uma denúncia do MPF/SC pelo crime de reduzir pessoas a condições análogas à de escravo (art. 149) e pelo crime de aliciamento (art. 207). No ano seguinte (em novembro de 2010), o mesmo Adão de Góes foi flagrado aliciando trabalhadores para a colheita de maçã.

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