O diretor de Assuntos Parlamentares do SINAIT, Leonardo Decuzzi, enfatizou em audiência pública a importância de uma “Inspeção do Trabalho eficaz, blindada à influência externa indevida e capaz de enfrentar os desafios de um mercado de trabalho em constante evolução e com dificuldades crescentes”. Esses e outros pontos foram defendidos durante a Sessão de Debates Temáticos, com foco na precarização do trabalho que ocorreu nesta segunda-feira, 29 de setembro, no Plenário do Senado Federal. As exposições foram mediadas pelo presidente da audiência, senador Paulo Paim (PT-RS).
De acordo com Leonardo Decuzzi, que já atuava na fiscalização do trabalho antes da Constituição de 1988 e que há muitos anos fiscaliza as relações informais, as fraudes na relação de emprego e também atua na mediação de conflitos coletivos de trabalho, explicou que, “as Auditoras e os Auditores Fiscais do Trabalho são as autoridades que primeiro se deparam com a realidade, as mazelas, as tensões dos ambientes laborais para assegurar o cumprimento do Direito do Trabalho, encarregados pela Constituição, as Leis trabalhistas, as Convenções e os compromissos internacionais assumidos pelo Brasil. Isso ocorre nos mais variados locais de trabalho que diariamente inspecionamos”.
Declarou que, na esteira do que afirma a OIT, não é possível estabelecer uma boa governança em relações do trabalho sem “uma Inspeção do Trabalho eficaz, blindada à influência externa indevida e capaz de enfrentar os desafios de um mercado de trabalho em constante evolução e com dificuldades crescentes”.
Segundo o dirigente, há um retorno de demandas de trabalhadores do Século XXI ao Século XIX, como jornadas de trabalho condizentes, remuneração justa e condições de trabalho adequadas.
O relatório do Projeto Fairwork divulgado na semana passada e as manifestações dos trabalhadores na audiência pública realizada pela comissão do PLP 152 na Câmara dos Deputados, também na semana passada, espelham essa situação. “Essas questões estão presentes nos debates em curso sobre o PLP 152 e no Tema 1.389 sob a relatoria do Ministro Gilmar Mendes e no Tema 1.291 sob a relatoria do Ministro Edson Fachin no Supremo Tribunal Federal”.
Terceirização
No caso da terceirização, Decuzzi explicou que, a terceirização na atividade fim é matéria regulada pela Lei 6.019 de 1974 e a Inspeção do Trabalho lida há muito tempo com ela. Foi ampliada em 2017 na reforma trabalhista, com as alterações na Lei 6.019 de 1974 e a sua constitucionalidade foi assegurada pelo Supremo Tribunal Federal (STF) no Tema 725, com repercussão geral, onde ficou assentado que: “é lícita a terceirização ou qualquer outra forma de divisão do trabalho entre ‘Pessoas Jurídicas’ distintas, independentemente do objeto social das empresas envolvidas, mantida a responsabilidade subsidiária da empresa contratante”.
A nova redação da Lei 6.019 exigiu requisitos para assegurar a idoneidade econômica da Empresa Prestadora de Serviços a Terceiros, como o registro na Junta Comercial e capital mínimo de 10 mil reais.
Mas a terceirização na atividade fim existe no Brasil desde a Década de 1990 em dois setores: telecomunicações e o de energia elétrica. No entanto, à época, ninguém afirmava que essas pessoas não eram trabalhadores, mas que eram empreendedores, ressaltando a utilização ilícita do MEI – Microempreendedor Individual para substituição de mão de obra empregada.
Atualidade
Segundo o dirigente, atualmente, a entrega de um pacote (entre dezenas entregues pelo trabalhador por dia) ou de um sanduiche numa residência é muito mais fiscalizado, controlado, vigiado do que o trabalho de um motorista de transporte coletivo que transporta em cada viagem dezenas de vidas humanas. “Esta é a situação de inversão de valores, de narrativas e de engenharia jurídica dirigidas à fuga do Direito do Trabalho que encontramos nesta quadra histórica em que vivemos”.
O que a Inspeção do Trabalho tem constatado com frequência, continuou, é o esgarçamento dos Temas de repercussão geral 725 do STF como também da ADC (Ação Declaratória de Constitucionalidade) 48 e ADI (Ação Direta de Inconstitucionalidade) 3.961 DF, Lei nº 11.442 de 2007, sobre o transporte rodoviário de cargas e o Transportador Autônomo de Cargas.
Enfatizou que se tem constatado uma verdadeira pandemia de precarização e fraudes no cumprimento da Lei. “Isso tem sido visto e relatado por inspeções realizadas nos mais diversos estados de nossa Federação. Por isso, o SINAIT usa este espaço para denunciar”.
Pejotização
No caso da Pejotização, continua o diretor, é importante que se demarque que o MEI - Micro Empreendedor Individual “Não é Pessoa Jurídica” apesar de ter CNPJ. “Não se insere no rol das pessoas jurídicas elencadas no art. 44 do Código Civil Brasileiro, pois não possui registro na Junta Comercial. Portanto, não pode ser a ‘pessoa jurídica prestadora de serviços’ a terceiros da Lei 6.019. A Inspeção do Trabalho já encontrava a utilização irregular da figura do MEI para mascarar a relação de emprego”.
Em razão disso, o SINAIT reafirma! Está se tornando uma pandemia em nosso país a contratação de empregados como se fossem microempreendedores individuais, em expresso descumprimento da Lei Complementar nº 123/2006.
Intermediação ou Plataformização do Trabalho
Leonardo Decuzzi explicou que na plataformização do trabalho a intermediação é uma ficção, pois uma plataforma digital é um modelo capitalista de negócios que flerta com o conceito de economia compartilhada (share economy) e de mera intermediação entre interessados no serviço prestado -, mas na verdade não há compartilhamento e sim extrema concentração de capital.
Destacou que, as plataformas dirigentes e geolocalizadas detém o controle da demanda, mapeiam e gerenciam a mão de obra disponível, por elas mediadas e subordinadas. A tecnologia cada vez mais passou a assumir funções habitualmente executadas por chefes, supervisores e gerentes dos empregados para dirigir a relação. “No Brasil não há fonte de dados oficiais sobre o número de trabalhadores, remuneração e dias trabalhados em cada empresa detentora de plataforma digital. A assimetria de informações é um problema crítico. Constitui um grande desafio para o Estado a realização de inspeções em empresas que não prestam informações, obstruindo a ação de fiscalização”.
Ao final, o dirigente destaca que no plano externo há avanços e citou a Diretiva da União Europeia, a legislação da Espanha e as recentes normas do México e do Uruguai; e no plano interno, o PLP 152 precisa avançar na transparência, na fixação de condições de trabalho, normas de saúde e segurança e em assegurar direitos e garantias mínimas legalmente previstas e demandadas pelos motoristas e entregadores. “Isso é essencial para dar segurança jurídica às empresas e assegurar direitos aos trabalhadores, independente da natureza do vínculo. Temos que pensar qual o tipo de país que estamos construindo e qual o tipo de trabalho que deixaremos para as novas gerações - o país do trabalho precário, da escravidão moderna ou do trabalho digno?”
Veja a apresentação na íntegra aqui do Leonardo Decuzzi.