Com informações da SRTE/SE
Trabalho sem férias, sem descanso semanal e sem salário. Dos 66 anos de vida, mais da metade dedicados aos afazeres domésticos de uma família. Foi nesse cenário que uma força-tarefa, sob a coordenação da Auditoria-Fiscal do Trabalho, resgatou, em Aracaju, uma idosa vítima de trabalho escravo doméstico. Equipes da Auditoria-Fiscal do Trabalho (SRTE-SE) Ministério Público do Trabalho em Sergipe (MPT-SE), e Polícia Federal em Sergipe (PF/SE) atuaram de forma conjunta para identificar e retirar a vítima da residência.
As investigações do caso começaram após uma denúncia anônima. Com os elementos colhidos na fase de investigação e autorização da Justiça, a operação de resgate foi deflagrada. Na última semana, quando estiveram no endereço informado, as equipes constataram violações a direitos fundamentais. A vítima nunca tirou férias e não tinha descanso semanal. Esse foi o primeiro resgate de trabalho escravo doméstico em Sergipe.
“Na prática, vemos que a expressão “como se fosse da família” termina camuflando a supressão de direitos fundamentais desses trabalhadores , como o não pagamento de salário, jornadas exaustivas, muitas vezes sem férias e folgas semanais. Ainda que não tenha a restrição da liberdade e maus tratos, mesmo assim o trabalho doméstico poderá ser caracterizado como análogo ao escravizado. Geralmente esses trabalhadores estão há muito tempo trabalhando para a família exploradora, em uma relação marcada pela dependência econômica e até mesmo emocional. É comum que a ausência de vínculos familiares e a relação de afeto e cuidado em relação aos empregadores terminem favorecendo a continuidade desses trabalhadores mesmo em um contexto de exploração” , pontuou a Auditora Fiscal do Trabalho Liana Carvalho.
A delegada da Polícia Federal Paula Cecilia de Santana Alves, que atua no combate ao crime de redução de pessoa a condições de trabalho análogas à escravidão, o grande desafio em identificar casos de trabalho escravo doméstico é o fato de a sociedade normalizar práticas abusivas. “Ações que caracterizam a exploração da vítima pelo empregador, muitas vezes, são consideradas normais pela sociedade, o que dificulta o registro de denúncias. Além disso, os empregadores adotam o discurso de que essa vítima seria da família, como se isso autorizasse ou possibilitasse o abuso. Trata-se de um mecanismo de manipulação para explorar a vulnerabilidade da vítima”, explicou a delegada.
A vítima e os empregadores foram ouvidos, na sede do MPT-SE, na capital, pelas equipes que realizaram o resgate. Após cálculo das verbas rescisórias devidas, foi firmado um Termo de Ajuste de Conduta (TAC) para pagamento dos valores à trabalhadora idosa. O caso segue em sigilo.
A força-tarefa contou com o apoio da Comissão Estadual para Erradicação do Trabalho Escravo (COETRAE/SE) e da Secretaria de Assistência Social do Município de Aracaju, que disponibilizou atendimento psicológico e acolhimento em um abrigo da capital.
Resgates no Brasil
Em 2024, mais de dois mil trabalhadores e trabalhadoras foram resgatados em condições semelhantes à escravidão no Brasil, segundo dados do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE). Pelo menos 22 ações de fiscalização foram realizadas no ambiente doméstico que resultaram em resgates de trabalhadores.
Historicamente, pela análise dos dados do Sistema Ipê de denúncias, o número de casos denunciados, e consequentemente o número de resgates, vem crescendo exponencialmente. Em 2020 foram apenas 5 denúncias e em 2024, 147 casos. Esse aumento de denúncias decorre principalmente da grande repercussão de casos de resgates veiculados na mídia. Essa é a principal função da divulgação desses tipos ação, alertar a sociedade das irregularidades e situações fáticas que, no caso concreto, possam caracterizar o trabalho escravo contemporâneo doméstico.
Casos de trabalho análogo à escravidão devem ser denunciados pelos seguintes canais:
Disque 100
Sistema Ipê: https://ipe.sit.trabalho.gov.br/#!/
Comunica PF: https://apps.pf.gov.br/r/comunicapf/comunicapf
Site do MPT-SE: www.prt20.mpt.mp.br