O SINAIT recebeu de Auditores Fiscais do Trabalho nesta segunda-feira, 3, notícias abaixo reproduzidas sobre o assassinato do líder comunitário José Maria Filho, 42 anos, ocorrido em Limoeiro do Norte (CE), no dia 21 de abril. Segundo os relatos, José Maria foi assassinado em razão de sua atuação como líder comunitário em defesa dos trabalhadores sem terra e contra o uso indiscriminado de agrotóxicos na região da Chapada do Apodi.
O SINAIT lamenta mais este episódio de violência no campo e se junta à indignação dos AFTs que enviaram a notícia, da população e das instituições sediadas em Limoeiro do Norte. O uso de agrotóxicos é um problema de saúde pública e também de segurança e saúde no trabalho. Muitos são os aspectos envolvidos como o uso de substâncias proibidas, a falta de equipamentos adequados na aplicação dos venenos, o excesso de produtos químicos utilizados, o descarte inadequado de vasilhames e a contaminação do lençol freático e do solo. Muitos trabalhadores são vítimas desta atividade e o excesso de agrotóxicos em alimentos prejudica a saúde de todos os consumidores causando um sem número de distúrbios e doenças. Auditores Fiscais do Trabalho verificam o cumprimento das normas de uso de agrotóxicos e testemunham que o problema é de grandes proporções.
Veja matérias sobre o assassinato de José Maria Filho, mais uma vítima da violência no campo:
21-4-2010
UM GRITO DE DENÚNCIA, UMA NOTA CONTRA A VIOLÊNCIA: JUSTIÇA AO COMPANHEIRO JOSÉ MARIA FILHO
Um crime provoca indignação e perplexidade: o assassinato de Zé Maria, 44 anos, ocorrido neste dia 21 de abril de 2010. Ele era presidente da Associação Comunitária São João do Tomé, presidente da Associação dos Desapropriados Trabalhadores Rurais Sem Terra – Chapada do Apodi, liderança do movimento social – filho da comunidade do Sítio Tomé - Limoeiro do Norte – CE. As razões do assassinato se encontram no bojo dos conflitos provocados pela presença do agrohidronegócio, instalado em meados da década de 1990 na região jaguaribana. Esses conflitos trouxeram uma realidade de profundas injustiças sociais para a nossa região. A comunidade de Tomé bem como outras que se localizam na Chapada do Apodi sofrem o descaso e o desrespeito dos órgãos públicos e a irresponsabilidade das grandes empresas que se fixa ram na Chapada e que atentam contra o meio ambiente e a saúde da coletividade.
Desde o início, Zé Maria se envolveu nas diferentes lutas contra essas injustiças, estando presente no Grito dos Excluídos, no Fórum Regional e seminários contra os Agrotóxicos, discutindo a problemática do uso da água. Sua voz ecoou em todo o Vale do Jaguaribe através das emissoras de rádio denunciando as violações dos direitos humanos que vitimam as comunidades da Chapada do Apodi.
Sua solidariedade inconteste o impulsionava ao debate e a denúncia cotidiana. Assumindo a defesa dos interesses coletivos, o bravo companheiro levou a todos os locais e momentos significativos das lutas os problemas dos trabalhadores rurais sem terra da Chapada do Apodí, as angústias e incertezas de centenas de famílias que recebem água contaminada e os infortúnios de dezenas de famílias que moram em casa de taipa na Comunidade do Tomé.
Este envolvimento o fez vítima. Vítima de quem? De que? Vítima dos conflitos (terra, água, agrotóxico) gerados pelo modelo de desenvolvimento do agrohidronegócio e, também, da inoperância e da negligência dos poderes públicos em solucionar esses conflitos.
Nos capítulos de nossa história muitos foram os/as companheiros/as que tombaram vítimas da expansão do agronegócio, da ganância desenfreada dos senhores do capital e da virulência social dos poderosos. Dentre eles/elas podemos citar o ecossocialista Chico Mendes, Pe. Josimo defensor da reforma agrária, a sindicalista Margarida Alves e a missionária Ir. Dorothy Stang. Seja com o seu exemplo de vida, seja na forma como lhe ceifaram a vida, Zé Maria assemelha-se a todos/as eles/as. E assim como a luta e a memória dos bravos lutadores não foram apagadas com a violência perpetrada por seus assassinos, também não serão esquecidos os teus gritos contra o agrotóxico, a tua defesa pela vida. É na Campanha da Fraternidade deste ano de 2010 que nos inspiramos para continuar a defesa dos direitos humanos, atentando para o ensinamento de Jesus: Vocês não podem servir a Deus e ao dinheiro (Mt. 6, 24).
É com essa determinação que os movimentos e instituições que assinam esta nota vêm a público se solidarizar com a família do companheiro e com toda a Comunidade do Sítio Tomé, repudiar todas as formas de violência, exigir a apuração rigorosa do crime e a punição dos culpados.
Limoeiro do Norte, 21 de abril de 2010
CÁRITAS DIOCESANA DE LIMOEIRO DO NORTE
NÚCLEO TRAMAS – UNIVERSIDADE FEDERAL DO CEARÁ
RENAPE – REDE NACIONAL DE ADVOGADO POPULAR
MAB – MOVIMENTO DOS ATINGIDOS POR BARRAGEM
CPT – COMISSÃO PASTORAL DA TERRA – DIOCESE DE L. DO NORTE
PASTORAIS SOCIAIS – DIOCESE DE LIMOEIRO DO NORTE
MST – MOVIMENTO DOS TRABALHADORES SEM-TERRA
FAFIDAM – FACULDADE DE FILOSOFIA DOM AURELIANO MATOS
21-4-2010
Limoeiro: Líder comunitário é executado em Tomé
Zé Maria do Tomé foi executado com 18 tiros de pistola ponto 40 e um de calibre 12
Nesta quarta-feira, por volta das 15h15, populares que ligaram para 4ª Companhia, informaram que na estrada que liga Limoeiro do Norte, ao sitio Tomé, a aproximadamente 01 KM do aeroporto da Chapada do Apodi e aproximadamente 5 km da sede do município, havia um corpo de um homem caído ao solo, com uma moto ao lado e que a vitima apresentava varias perfurações, aparentemente por arma de fogo.
De posse das informações, a equipe do GPM de Tomé, na viatura de placa NQU-2101, composta pelos cabos Reginaldo Araújo da Silva, Valderi Nogueira Costa e o soldado Ozéias Moura dos Reis, se deslocaram ao ponto informado e constataram o fato. A área do crime foi isolada até a chegada da perícia, a qual foi realizada pelo perito Marcos, que constatou no corpo da vitima cerca de 18 (dezoito) perfurações de Pistola 40) e uma de Calibre 12 ), indicando ainda que, todos os disparos atingiram a vitima do tórax para a cabeça.
Após o trabalho pericial, o corpo da Vitima foi recolhido pelo rabecão para ser levado ao IML de Quixeramobim, onde será realizado o exame cadavérico.
A vitima:
A policia identificou que a vitima era o comerciante e líder comunitário na Chapada do Apodi de nome e trafegava em uma Moto Broz de cor vermelha ano 2009 e Placa NRD – 5247. José Maria Filho tinha 42 anos de idade. Ele era filho de José Bernardo Filho e Maria Leonor de Jesus. Na comunidade do Tomé onde residia ele era conhecido como Zé Maria do Tomé e se destacou na chapada na luta por terras para os pequenos agricultores, a aplicação dos agrotóxicos através de aeronaves e a luta para acabar com as casas de taipa.
A policia militar realizou ronda na área do crime mas não conseguiu informações que levem ao autor do crime.
23-4-2010 – O Povo (CE)
Editorial - Voz silenciada
O assassinato do líder comunitário José Maria Filho, no município de Limoeiro do Norte comove a opinião pública democrática
Raquel Maria Rigotto - Profa. Departamento de Saúde Comunitária, Núcleo TRAMAS - Trabalho, Meio Ambiente e Saúde para a Sustentabilidade - Faculdade de Medicina da Universidade Federal do Ceará
A opinião pública do Ceará foi surpreendida, nesta quarta-feira do feriado de Tiradentes, pela notícia da execução do líder comunitário José Maria Filho, na localidade de Sítio Tomé, em Limoeiro do Norte. O corpo foi encontrado por populares. A vítima tinha 18 perfurações a bala.
José Maria vinha se destacando pela luta contra o uso de agrotóxicos na Chapada do Apodi, além de ser porta-voz da comunidade nas reivindicações desta, envolvendo várias questões que englobavam também denúncias sobre injustiças nas desapropriações, dos que foram desapropriados pelos grandes projetos de irrigação na Chapada do Apodi.
Chama atenção o caráter provocativo da execução realizada com quase duas dezenas de tiros, o que supõe uma tentativa de intimidação e não apenas o propósito de calar uma boca. Ou seja, um recado para os movimentos sociais que atuam na área.
Sabe-se que o uso de agrotóxico se, em si mesmo, já oferece um grande perigo para a saúde humana e animal, torna-se um verdadeiro atentado à vida humana, da forma descuidada com que é utilizado e propagado, em vista do completo descuido dos responsáveis, seja em relação aos usuários, seja aos consumidores dos produtos cultivados através desse método de prevenção ou tratamento das pragas da lavoura.
Aqui, mesmo, neste espaço, já levantamos essa questão por diversas vezes. Pesquisas realizadas no Estado demonstram que nas áreas contaminadas por agrotóxicos é grande a incidência de doenças de alta letalidade, sobretudo, a leucemia. As borrifações das lavouras são feitas descuidadamente & inclusive as aéreas & contaminando o entorno, inclusive, os mananciais. Além disso há o fato de que os próprios agricultores que a manuseiam não são devidamente instruídos sobre os perigo s do manuseio.
Não faz muito expusemos aqui as denúncias formuladas pelo pesquisador José Júlio da Ponte, Presidente da Academia Cearense de Ciências e comendador da Ordem Nacional do Mérito Científico que, em artigos publicados por este jornal: ``Mapeamento dos agrotóxicos`` e ``Frutas e Verduras: a Dieta do Câncer`` expôs o perigo a que está exposta a sociedade cearense. Chegou a apresentar alternativas de combate às pragas: defensivos agrícolas naturais. Ele próprio, um cientista, se sente discriminado em sua campanha contra os agrotóxicos, imagine-se o que podia esperar um líder comunitário, enfrentando a pressão do meio em que se encontra.
Mas, isso não pode ficar assim. O repto lançado pelos assassinos à sociedade cearense extrapola todos os limites. Não se pode permitir que permaneçam impunes e zombando da ordem legal. A sociedade exige uma resposta rápida e demolidora, a fim de que este novelo seja desenrolado até o fim e os respo nsáveis, que estão ocultos, sejam alcançados pelo braço da Justiça. É o mínimo que se exige das autoridades do Estado.