A relatora especial das Nações Unidas (ONU) sobre formas contemporâneas de escravidão, a advogada armênia Gulnara Shahinian, recebeu diversos representantes de entidades e da sociedade civil organizada em um encontro que teve como principal objetivo criar um espaço para que organizações da sociedade civil e organizações laborais transmitissem à Relatora as preocupações acerca de formas contemporâneas de escravidão no Brasil, observadas a partir de seu trabalho, na forma de recomendações.
Na oportunidade, a presidente do SINAIT, Rosângela Rassy entregou à Relatora documento em que relaciona as principais dificuldades enfrentadas pela Auditoria Fiscal do Trabalho no combate ao trabalho escravo. Rosângela manifestou a preocupação da categoria com o descumprimento da Convenção 81 da OIT, que prevê o número mínimo de AFTs comparado à população economicamente ativa. Esse foi o ponto de destaque do pronunciamento da presidente. Segundo ela, o número reduzido de AFTs e a escassez de vagas oferecidas em concursos impedem o atendimento de muitas denúncias. Essa questão foi confirmada e reiterada pelos representantes da Confederação Nacional dos Trabalhadores, Antônio Lucas, e da Comissão Pastoral da Terra, Pe. José Iborrá. Antônio Lucas, disse que os Auditores Fiscais do Trabalho não dispõem nem mesmo de motoristas para o deslocamento durante as ações e muitas vezes precisam dirigir os carros do MTE.
As condições precárias de trabalho, devido à falta de equipamentos essenciais para o desenvolvimento do trabalho dos AFTs, também foi um dos problemas informados à Relatora pelo SINAIT..
A presidente acrescentou ainda outra conseqüência grave gerada pela redução de ações devido à falta de AFTs, “O aumento de acidentes de trabalho, muitos com morte”. A indicação política para cargos de superintendente foi colocada pela presidente como uma interferência externa no trabalho da Auditoria. Para ilustrar a questão ela citou o caso Pagrisa, que ficou conhecido nacionalmente em 2008, quando AFTs resgataram mais de mil trabalhadores submetidos á condições análogas a de escravo e, durante a ação, houve tentativa de intimidação por parte de um grupo de parlamentares que acompanharam o superintendente ao local da ação.
Rosângela solicitou ainda o apoio da ONU na criação da Escola Superior da Inspeção do Trabalho, cujo estudo está sendo elaborado pela Universidade de Brasília. “O objetivo é formar e capacitar AFTs para atuarem nas diversas áreas da Auditoria Fiscal do Trabalho.
Chacina de Unaí
Rosângela pediu ainda a intervenção do órgão internacional no sentido de que sejam julgados os acusados do crime de Unaí. “Passados seis anos do assassinato dos três Auditores Fiscais do Trabalho e do motorista do MTE, os acusados permanecem impunes. Esse crime ficou conhecido internacionalmente e é muito importante para todos que os assassinos e mandantes sejam julgados e punidos exemplarmente”, afirmou.
A aprovação da PEC 438/01, que aguarda votação desde 2004, na Câmara foi uma das reivindicações comuns. Os presentes pediram apoio para a votação da matéria que será instrumento de punição para os empregadores escravagistas.
A convite do Governo Federal, Gulnara ficará no Brasil até o dia 28, para se reunir com autoridades do governo, membros do Poder Judiciário e ONGs. Ela participa, juntamente com AFTs coordenadores de grupos de fiscalização rural e do grupo móvel do 1° Encontro Nacional pela Erradicação do Trabalho Escravo que está sendo realizado em Brasília no período de 25 a 27 de maio.
Gulnara Shahinian valorizou a postura adotada pelo Brasil, que reconhece a presença de formas contemporâneas de escravidão em seu território e tem políticas de enfrentamento a esta prática. “Temas relacionados à escravidão dificilmente são reconhecidos pelos países, que preferem esconder a prática. Eles até assumem a questão do tráfico de pessoas, mas de trabalho forçado, escravidão por dívida, não”, enfatizou a relatora. A relatora garantiu que todas as informações apresentadas na reunião serão levadas à ONU e deverão gerar relatório de recomendações.