Justiça Federal indefere liminarmente pedido contra a Portaria do Ponto Eletrônico


Por: SINAIT
Edição: SINAIT
04/08/2010



 


"Com efeito, a norma combatida pretende regular uma relação jurídica cujo objeto é o direito social ao trabalho, em cujo âmbito a atividade intervencionista do Estado entremostra valorada pela própria Constituição Federal. Aliás, segundo o próprio Texto Constitucional, a nossa ordem econômica funda-se na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa e tem por fim assegurar a todos a existência digna, conforme os ditames da justiça social (art.170)" (os destaques são do texto original).



Com esse entendimento, de clareza meridiana, o MM. Juiz Federal Substituto no Exercício da Titularidade da 21ª Vara Cível, Dr. Eurico Zecchin Maiolino, indeferiu, liminarmente, o pedido da ABREVIS - Associação Brasileira das Empresas de Vigilância e Segurança, que ajuizara Ação Ordinária requerendo a ilegalidade da Portaria MTE nº 1510/2009, que institui o Sistema de Registro Eletrônico de Ponto - SREP, pleiteando a suspensão da exigilidade para que não fosse autuada ou multada pelo descumprimento daquela norma.



A Autora alegou que o equipamento e as obrigações acessórias acarretam grandes prejuízos pois tem um custo muito alto e que ensejam a disponibilidade de técnicos especializados e gastos com, tinta, papel, programas de treinamento e certificação regulares.  Sustentou, ainda, que a Portaria viola os princípios constitucionais da ilegalidade, proporcionalidade, interesse público, livre iniciativa, proteção ao meio ambiente, além de provocar insegurança jurídica.



O Juiz Federal destacou que a Portaria vem fundamentada no art. 84, II, da Constituição Federal, e artigos 74, § 2º, e 913, ambos da CLT e que a criação dos requisitos contidos na norma, qual seja, a obrigação legal do controle eletrônico de entrada e saída de empregados, não trouxe obrigação diferente daquela contida na própria CLT e, por outro lado, não se mostrou inadequada para atingir a finalidade legal. Ao contrário, buscou evitar fraudes e otimizar o controle do horário de trabalho dos funcionários (destacamos).

Para o SINAIT, a Portaria Ministerial em questão foi baixada com a finalidade de dar efetividade ao direito do empregado verificar se o salário corresponde às horas efetivamente por ele trabalhadas, em observância aoart. 74, § 2º da CLT. O  Sistema de Registro Eletrônico de Ponto - SREP - dará maior segurança ao trabalhador e  certamente  diminuirá as fraudes no registro da jornada de trabalho, e repercutirá diretamente no salário, 13º, repouso semanal remunerado, FGTS, contribuição previdenciária e imposto de renda. Como é de conhecimento, o principal atingido pelo prejuízo causado pela fraude nessas informações é o próprio empregado - que é o lado mais fraco na relação capital x trabalho - além dos cofres públicos.  Não é demais lembrar, que o excesso na jornada de trabalho é uma das irregularidades que mais ocorre, o que tem levado a Auditoria Fiscal do Trabalho a lavrar  autos de infração contra os maus empregadores e é também uma constante nos inúmeros processos que se acumulam nas Varas de Trabalho, nos Tribunais Regionais e no Tribunal Superior do Trabalho.




Não é a primeira vez que a Justiça Federal resguarda a Portaria Ministerial. Recentemente, o Ministro Cesar Asfor, do Superior Tribunal de Justiça - STJ negou liminar à instituição que resistia à implantação do ponto eletrônico, conforme matéria publicada no site do SINAIT, no dia 21 de julho deste ano.


 

Veja a seguir a íntegra da decisão judicial:

 

PODER JUDICIÁRIO

JUSTIÇA FEDERAL

 


 

CONCLUSÃO

 

Em 30/07/2010, faço conclusos estes autos ao MM. Juiz Federal Substituto no Exercício da Titularidade desta 21ª Vara Cível, Dr. Eurico Zecchin Maiolino.

Eu,....., Técnico Judiciário.

 

 

21ª Vara Cível

Ação Ordinária

Processo nº 0014884-96.2010.403.6100

Autor: ABREVIS Associação Brasileira das Empresas de Vigilância e Segurança

Réus: União Federal

 

 

VISTOS.

 

 

ABREVIS Associação Brasileira das Empresas de Vigilância e Segurança ajuizou a presente Ação ordinária, com pedido de tutela antecipada, em face da União Federal, pleiteando a declaração de ilegalidade da Portaria MTE nº 1.510/2009 e, por conseqüência, a suspensão de sua exigibilidade e eficácia em face seus associados, determinando-se, ainda, a ré que se abstenha de autuar ou punir pelo descumprimento de seus mandamentos.

Alega a Autora que é associação civil de âmbito regional que congrega empresas do ramo de vigilância e segurança privada e que dentre seus objetivos sociais está o da defesa dos interesses coletivos e individuais homogêneos dessa categoria empresarial.

 

Assevera que a Portaria MTE nº 1.510/2009 disciplinou o uso de registro de ponto eletrônico, o qual passa a se submeter a exigências que se afirma ilegais, isso porque o equipamento e as obrigações acessórias impostas pelo Ministério do Trabalho e Emprego acarretam grandes prejuízos.

 

Narra a inicial que referido equipamento tem custo muito alto, além de, a cada apontamento de horário pelos empregados, emitir recibo, o que, dentre outros problemas, enseja a disponibilidade de técnicos especializados para ajustes diários na máquina, além de sua manutenção e gastos com tinta, papel, programas de treinamento e certificação regulares.

 

Finalmente, a autora sustenta que o ato normativo atacado viola os princípios constitucionais da legalidade, razoabilidade, proporcionalidade, interesse público, livre iniciativa, proteção ao meio ambiente, além de provocar insegurança jurídica.

 

A inicial veio acompanhada de documentos (fls. 17/71) e as custas processuais foram recolhidas (fl. 72).

 

Determinada a emenda à petição inicial, a Autora apresentou a petição de fl. 77/7

 

 

É o relatório.

 

FUNDAMENTO E DECIDO.

 

 

Cuida-se de ação Ordinária em que se pleiteia o reconhecimento da ilegalidade da Portaria nº 1.510/2009, do Ministério do Trabalho e Emprego que instituía a utilização do Sistema de Registro de Ponto (SREP)determinando as empregadoras com mais de 10 (dez) funcionário que utilizem equipamentos eletrônicos de marcação de jornada de trabalho ou que venha a usá-los, que passem a usar os equipamentos com as características previstas naquele ato normativo, sob pena de autuação por Auditor-Fiscal do Trabalho.

 

O pedido de antecipação dos efeitos da tutela jurisdicional deve ser indeferido.

 

A Portaria MTE nº 1.510/2009, estatui, em seu art. 1º, que seu objetivo é a disciplina do registro eletrônico de ponto e utilização do Sistema de Registro Eletrônico de Ponto – SREP, estabelecendo a obrigatoriedade do Registrados Eletrônico de Ponto SREP e discorrendo acerca dos requisitos do equipamento.

 

O Excelentíssimo Senhor Ministro de Estado do Trabalho e Emprego fundamentou a edição do ato no art. 84, II, da Constituição Federal, e arts. 74, § 2º, e 913 da Consolidação das Leis do trabalho.

 

O art. 84, II, da Constituição Federal, prevê que compete ao Presidente da República exercer, com o auxílio dos Ministros de Estado, a direção superior da administração federal.

 

Os arts. 74, § 2º, e 913 da Consolidação das Leis do Trabalho prescrevem o seguinte:

Art. 74 - O horário do trabalho constará de quadro organizado conforme modelo expedido pelo Ministério do Trabalho, Industria e Comercio, e afixado em lugar bem visível. Esse quadro será discriminativo no caso de não

ser o horário único para todos os empregados de uma mesma seção ou turma.

(...)

 

§ 2º - Para os estabelecimentos comerciais de mais de dez trabalhadores será obrigatória a anotação da hora de entrada e de saída, em registro manual, mecânico ou eletrônico, conforme instruções a serem expedidas pelo Ministério do Trabalho, devendo haver pré-assinalação do período de repouso.

 

Art. 913 - O Ministro do Trabalho, Industria e Comercio expedirá instruções, quadros, tabelas e modelos que se tornarem necessários à execução desta Consolidação.

 

Pois bem. À evidência, o art. 84, II, da Constituição Federal, ao prescrever que os Ministros do Estado auxiliarão o Presidente da República na direção superior da administração federal, não lhes atribui competência a ser exercida independentemente do que estabelecem as leis do País e da Constituição Federal. Assim, no exercício do seu elevado mister, devem, também os Ministros, observância ao principio da legalidade, previsto no art. 5º, II1, no art. 37, caput2, da Constituição Federal.

 


 


 

 

Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: (...) II - ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei.”

No sistema constitucional brasileiro portanto, apenas a lei pode criar obrigações e induzir comportamentos específicos ou genéricos e os atos normativos infralegais têm sua esfera de atribuição delimitada e circunscrita pela lei.

 

É possível, por conseguinte, que sejam editados atos normativos por autoridades administrativas, no exercício de sua competência normativa, que difere da competência legislativa, afeta, no Brasil, somente ao Poder Legislativo. Tais atos normativos, contudo, não podem, à míngua de previsão legal, ainda que abstrata ou principiológica, estabelecer primariamente obrigações às pessoas ou mesmo induzir comportamentos ou condutas.

 

A edição do ato normativo pela Administração Pública, assim, deve ter supedâneo legal, não lhe sendo possível a criação de obrigações jurídicas, por isso vinculantes, originária e autonomamente.

 

Nesse sentido, ao desenvolver e pormenorizar aquilo que na lei vem previsto, a atuação da Administração Pública não está circunscrita à reprodução dos termos legais, caso em que se esvaziaria a atividade normativa da Administração e tornaria de toda sorte inútil a edição de atos deste jaez. A Complementação, o detalhamento o aperfeiçoamento e o desenvolvimento daquilo que na lei esta previsto necessariamente envolve um ato de criação e inovação por parte da autoridade que edita o ato, mas deve observar os termos e limites legais, traduzindo a vontade da lei3. 


 


 

 Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência.

No caso em questão, segundo o art. 74, § 2º, da Consolidação das Leis do Trabalho, acima transcrito, compete ao Ministério do Trabalho e Emprego a expedição de instruções para a disciplina do registro manual, mecânico ou eletrônico da anotação da hora de entrada e saída dos trabalhadores nos estabelecimentos em que houver mais de dez trabalhadores.

 

Assim, a própria lei já criou a obrigação legal de anotação da hora de entrada e saída dos trabalhadores, ao prescrever sua obrigatoriedade, outorgando à Administração Pública sua disciplina, no exercício de sua competência normativa. Exatamente no exercício desta competência e nos limites que a lei lhe conferia, é que foi editada a Portaria MTE nº 1.510/2009.

 

Desta Forma, o estabelecimento dos requisitos dos Registradores Eletrônicos de Ponto SREP e a maneira do controle do registro eletrônico hora de entrada e saída dos estabelecimentos com mais de dez trabalhadores pelo ato normativo apenas conformam a obrigação legal de controle, sem desbordar dos limites previstos em lei.

 

Acrescente-se, ademais, que ao Ministro de Estado do Trabalho e Emprego foi conferida, pela lei, uma margem de apreciação subjetiva na disciplina da matéria, vale dizer, outorgou-se-lhe discricionariedade para a edição do ato normativo. 


 

 


 

Oportunas, assim, as palavras de Caio Tácito, ao afirmar que “Regulamentar não é somente reproduzir analiticamente a lei, mas ampliá-la e completá-la, segundo o seu espírito e o seu conteúdo, sobretudo nos aspectos que a própria lei,

expressa ou implicitamente, outorga à esfera regulamentar.” (Temas de Direito Público. Volume 1. Rio de Janeiro: Renovar, 1997, p. 510).

 

Embora a edição do ato esteja inserida no âmbito no exercício da competência da autoridade administrativa, não se retira do Poder Judiciário a possibilidade de perquirir acerca da correspondência do conteúdo do ato com o fim da norma legal, nem tampouco a adequação material do ato para atingimento da finalidade legal.

 

A discricionariedade define-a Marçal Justen Filho, como “o modelo de disciplina normativa da atividade administrativa que se caracteriza pela atribuição do dever poder de decidir segundo a avaliação da melhor solução para o caso concreto”4.

 

Cuida-se, assim, segundo esta concepção, de uma técnica de disciplina normativa, entendida a norma como um preceito acerca da conduta das pessoas que não se confunde com a lei. A lei é somente uma forma de expressão da norma jurídica, vale dizer, a lei contém a norma jurídica ou múltiplas normas que são extraídas pelo processo de interpretação. Sendo impossível à lei prever, de maneira absoluta e exaustiva, todos os fatos sociais que demandem regulamentação e, ainda, acompanhar as constantes mutações sociais, deixa à Administração Pública espaço para decidir o caso concreto segundo os critérios previamente estabelecidos observada a finalidade legal.

 

Desta forma, a compreensão da discricionariedade como uma forma de disciplina normativa implica o reconhecimento de que o administrador, ao exercer seu juízo subjetivo para a eleição da melhor alternativa possível contribui para a formação da norma jurídica e para o atendimento da finalidade prevista na lei que lhe outorga competência.

 

Por conseguinte somente pode existir discricionariedade onde o legislador conferiu margem de apreciação subjetiva ao administrador, vale dizer, naquelas situações nas quais o integração da norma com sua vontade, contribuindo para a sua completa inteligência e formação5. Discricionariedade e legalidade não são, por conseguinte, conceitos antitéticos.

 

Esta técnica, em linhas gerais, decorre de uma expressa opção legislativa, em matérias em que a lei deixa ao administrador uma margem de apreciação ulterior (seja quanto ao momento de agir eleições das alternativa decisórias e dos instrumentos utilizáveis, ou da ponderação dos efeitos de suas decisões) ou ainda pela utilização de conceitos jurídicos indeterminados, quando é impossível retirar do aplicador uma margem de lei. 

 


 


Curso de Direito Administrativo. São Paulo: Saraiva, 2005, p. 154.

 

Observada a margem de discricionariedade, ao Poder Judiciário imiscuir-se no mérito do ato para substituir-se ao administrador e praticar o ato de acordo com sua apreciação subjetiva. No entanto, como acima referido, a prática do ato deve obedecer à sua finalidade legal com o que se conclui que a previsão da infração e de uma gama de punições passíveis de serem aplicadas pela autoridade, implica o reconhecimento de que o conteúdo do ato deve ser adequado ao atingimento da finalidade. Assim, embora de maneira excepcional, se o conteúdo demonstra-se desproporcional em relação ao seu fim, o Poder Judiciário pode ser chamado ao restabelecimento da ordem jurídica e, em conseqüência, readequar a solução do caso concreto à finalidade da norma.

 

No caso em testilha, respeita-se, que a criação de requisitos para o exercício da obrigação legal do controle eletrônico da entrada e saída de funcionários pelo ato inquinado de ilegal, não criou obrigações diferentes daquelas previstas na própria lei, nem tampouco se mostra inadequada para atingir a finalidade legal. Contrariamente, busca evitar fraudes e otimizar o controle do horário de trabalho dos funcionários.

 

Ao menos dessa fase de consignação superficial, demais disso, não parece encontrar-se vulnerado o princípio da liberdade de iniciativa econômica. Com efeito, a norma combatida pretende regular uma relação jurídica cujo objeto é o direito social ao trabalho se entremostra valorada pela própria Constituição Federal. Aliás, segundo o próprio Texto Constitucional, a nossa ordem econômica funda-se na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa e tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social (art. 170).

 

 


 


  Sob esta perspectiva, é possível que o legislador retome a atribuição colaborativa na formação da norma jurídica, que antes havia sido conferida ao administrador.

 

 

Verificada, por conseguinte, a ausência da verossimilhança das alegações da Autora, na forma acima reconhecida, como exige o art. 273 do Código de Processo Civil, deve ser indeferido o pedido de antecipação dos efeitos da tutela jurisdicional.

 

 

Diante do exposto, INDEFIRO O PEDIDO DE ANTECIPAÇÃO DOS EFEITOS DA TUTELA JURISDICIONAL.

 

 

 

Intimem-se. Cite-se.

 

 

 

São Paulo, 2 de agosto de 2010.

 

 

 

EURICO ZECCHIN MAIOLINO

                                                                  Juiz Federal Substituto

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